[Você matou um terror desperto, A Tecelã de Vermes do Coração.]
O Feitiço sussurrou, sua voz ecoando com uma suavidade terna e despertando fragmentos de uma vida perdida.
As recordações do Peregrino começaram a tomar forma, dançando em meio ao espaço etéreo de suas lembranças desordenadas.
"Essa voz… Sunless uma vez a comparou com a de Cássia", pensou ele, deixando-se envolver por uma saudade familiar.
Recordou os momentos em que Sunless, sempre astuto, descrevia o mundo ao seu redor com uma intensidade quase poética. Naquele instante, as fronteiras entre a realidade e a ficção tornavam-se finas, como um véu delicado.
"Ele viu a totalidade do rio do tempo na tumba de Ariel", continuou a lembrar, "e descobriu que terminava em seu próprio início, um loop."
O Peregrino sorriu.
"O que GuiltyThree está cozinhando para a trama de 'Shadow Slave'? Será que os personagens estão vivendo os mesmos eventos repetidas vezes desde o início da história? Será que ele é realmente o responsável pela criação deste mundo?"
As lembranças de universos literários entrelaçavam-se em sua mente.
"Seriam os autores dessas histórias divindades capazes de criar novos mundos? Será que todo ser humano desse mundo tem esse potencial ou 'Shadow Slave' seria apenas uma realidade contida em si mesma?"
O Peregrino não tinha respostas, mas sabia que ali, naquele espaço surreal, as possibilidades pareciam infinitas.
[Acorde, desafiante! Seu pesadelo acabou.]
A voz terna soou novamente, firme e encorajadora.
[Prepare-se para a avaliação…]
***
O Peregrino encontrou-se em um vazio negro sem fim, iluminado por uma infinidade de estrelas. Entre elas, cordas de luz prateada formavam uma rede complexa, tecendo diversos nexos e constelações. Era realmente impressionante.
"Esse é o funcionamento interno do Feitiço do Pesadelo", reconheceu ele, enquanto a visão evocava a imaginação de uma rede neural celestial.
Aquela ideia fez o Peregrino estremecer.
"Será que o Feitiço é consciente? Afinal, no romance, seus comportamentos transmitiam emoções — às vezes, mesmo que sutis", questionou internamente.
A lógica dizia que o Feitiço não era uma entidade, mas, naquele momento, o Peregrino sentia como se estivesse diante de um ser vasto e divino. Um frio na espinha percorreu-o, enquanto a sensação de insignificância diante daquela presença provocava um calafrio.
As perguntas e dúvidas pesavam sobre ele, mas logo seu foco se ajustou, e seu coração voltou a pulsar, atento ao que o Feitiço poderia lhe oferecer.
[Você recebeu uma Memória: Sonho do Coração Profundo.]
O semblante do Peregrino iluminou-se, e um sorriso despontou no canto dos lábios. Aquela Memória pertencia a um terror desperto — um prêmio raro e valioso.
"Espero que seus encantamentos sejam passivos", disse para si mesmo, avaliando as possibilidades e aplicações futuras. Ele desejava explorar o Sonho do Coração Profundo, mas não conseguiria agora. O Feitiço já havia concluído a avaliação, e as perguntas sem resposta do Peregrino se acumulariam ainda mais.
[Desafiante! Sua avaliação foi concluída.]
[Você derrotou um humano dormente: -sem nome-.]
[Você derrotou uma besta dormente: Verme do Coração.]
[Você recebeu a bênção do -desconhecido-.]
[Você derrotou um terror desperto: A Tecelã de Vermes do Coração.]
Uma sensação repentina de vulnerabilidade tomou conta dele.
"Desconhecido… O Deus Esquecido dos Sonhos?" ponderou. Poderia "Ele" ser a razão de sua transmigração?
"O deus que pode estar corrompido!?"
Absorvendo o peso daquela possibilidade, pensamentos agitados invadiram sua mente: a bênção traria poder? Destruição? Novas responsabilidades? Ou faria dele apenas mais uma peça em um jogo vasto e incompreensível?
[Você conseguiu o impossível!]
[Avaliação final: Gloriosa.]
[-sem nome-, seja bem-vindo ao mundo!]
[-sem nome-, receba sua bênção!]
Por mais que desejasse compreender o significado exato daquelas palavras, sabia que muitas respostas ainda estavam fora de seu alcance.
"Aliás, o Feitiço disse: 'Bem-vindo ao mundo'?"
Lentamente, um calor de animação começou a florescer dentro dele, e um sorriso iluminou seu belo rosto.
[Você recebeu um Nome Verdadeiro: Ariandel.]
Os olhos do Peregrino reluziram.
"Um Nome Verdadeiro… Eu recebi um Nome Verdadeiro!"
[Seu Aspecto está pronto para evoluir. Evoluir Aspecto?]
Ariandel tentou controlar suas emoções, mas, sem sucesso:
"Sim, por favor!" ele exclamou, cerrando os punhos.
[Aspecto Dormente: Andarilho dos Sonhos está evoluindo…]
[A expectativa o envolveu como uma onda.]
[Novo Aspecto adquirido.]
[Ranque do Aspecto: Divino.]
"É divino", murmurou Ariandel, alisando os cabelos com os dedos trêmulos.
[Nome do Aspecto: Trama dos Sonhos.]
"Divino…" repetiu, quase sem acreditar. A surpresa foi tão profunda que, por um momento, perdeu os sentidos.
"Estou acordado?"
Piscou.
"Ou melhor, consciente, já que ainda estou tecnicamente dormindo na câmara subterrânea da delegacia."
Atônito, convocou as runas e encontrou as linhas que descreviam seu Aspecto:
Aspecto: [Trama dos Sonhos].
Ranque do Aspecto: Divino.
Descrição do Aspecto: [Você é uma criatura tecida de sonhos, traída e destinada a vagar só. Contudo, há algo em você que insiste em persistir, portando poderes líricos formados a partir da própria imaginação.]
Habilidade Inata: [Caleidoscópio].
Descrição da Habilidade: [Seus olhos percebem nuances ocultas e interpretam o mundo com uma profundidade que ultrapassa o comum.]
"Isso é… muita coisa para digerir."
Para começar, seu coração reconheceu:
"Um Aspecto Divino", enquanto disparava eufórico.
[O Primeiro Selo está quebrado.]
O Feitiço continuou:
[Despertando poderes dormentes…]
Ariandel sentiu algo despertar dentro dele. Segurando o peito, olhou para a escuridão, concentrando-se na sensação. Não sabia descrever o que sentia; era algo que jamais havia experimentado. Uma energia que não vinha de uma fonte externa, mas de dentro, como se sempre tivesse lá, adormecida.
A energia preencheu cada fibra de seu ser. Ele sentiu como se uma estrela em miniatura queimasse no centro do peito. Sentiu seu corpo começar a mudar. Ondas de calor irradiavam da estrela, alcançando lentamente seu estômago, ombros, braços, pernas e, finalmente, suas mãos e pés. Sob aquele calor, ossos, músculos e órgãos eram reconstruídos e revitalizados. Sentiu como se estivesse renascendo.
Ariandel estava se tornando mais forte, mais rápido, mais saudável, mais esperto.
"Que fantástico!" exclamou.
A cada segundo, sua transformação se intensificava, e ele riu, misturando incerteza e a alegria de viver em um mundo tão vibrante. Uma nova confiança estabeleceu-se em seu coração.
Ariandel não seria mais um garoto sem nome da periferia, temeroso das incertezas.
Ele não seria mais um jovem indefeso, tão vulnerável quanto em sua primeira vida.
Com seus poderes despertos e sua vontade temperada pela provação do Primeiro Pesadelo, via-se agora com um futuro repleto de possibilidades.
Após algum tempo, a estrela ardente em seu peito finalmente esfriou. O calor intenso deu lugar a um frio calmante, que lavou seu corpo, dissipando dores e desconfortos que ele nem sabia carregar.
Esse frio subiu, alcançando seu cérebro e, finalmente, seus olhos. E, então, sua visão começou... a curvar-se de maneira estranha.
Não... não, foi o mundo que se curvou de um jeito impossível.
"Como a refração da luz em torno de um buraco negro, eu acho…"
Um vórtice de cores emergiu do vazio, fragmentando o universo.
O vazio não era vazio; era um mar estrelado, refletindo luzes impossíveis, transbordando mistério e beleza.
"Este é o meu Mar da Alma."
No centro daquele oceano silencioso, girava um vórtice de cores, infinitas e insondáveis.
Era… lindo.