O último sino do dia ecoou pelos corredores, anunciando o fim das aulas. Eu estava sentado na minha carteira, absorto em um caderno, rascunhando palavras que se transformavam lentamente em frases, parágrafos, uma história. Ao meu redor, os colegas de classe se levantavam, conversavam animadamente sobre planos para depois da escola, mas eu estava alheio a tudo, concentrado em meu próprio mundo.
— O que você tá escrevendo aí, Shin? — A voz de Seiji me trouxe de volta à realidade. Ele se inclinou sobre minha mesa, tentando espiar o que eu estava fazendo.
— Nada, só rascunhando umas ideias — respondi, tentando desviar o caderno para longe do seu alcance, mas Seiji era rápido e já havia pegado o caderno.
— Ei, devolve isso! — tentei puxar o caderno de volta, mas Seiji já o estava lendo.
Rintarou, que estava perto, se juntou a ele, e ambos começaram a folhear as páginas.
— É uma história? — Rintarou perguntou, surpreso, enquanto lia alguns trechos.
Eu acenei de leve, sentindo um calor incômodo subir pelo rosto. Era a primeira vez que alguém lia algo que eu havia escrito.
— De quem é essa história? — insistiu Rintarou, ainda mais curioso.
— É... minha — murmurei, quase inaudível. Seiji e Rintarou se entreolharam, surpresos.
— Uau, Shin, você realmente nos surpreendeu dessa vez. — Seiji comentou, devolvendo o caderno. — Nunca imaginei que você fosse escrever algo.
Fiquei em silêncio por um momento, organizando meus pensamentos. Olhei para o caderno, ainda um pouco constrangido, mas decidi abrir o jogo.
— Eu... comecei a ler uns livros recentemente, como o livro que o Rin me indicou. Me inspirou a tentar escrever algo — murmurei, ainda um pouco nervoso.
Rintarou sorriu e assentiu, parecendo compreender.
— Isso é ótimo, Shin! Mas você sabe que escrever uma história é um grande desafio, né? — Rintarou disse com um sorriso de incentivo — Requer muito tempo e dedicação.
Assenti, sentindo um misto de ansiedade e determinação.
— Eu sei... mas quero tentar mesmo assim — respondi, sentindo uma mistura de nervosismo e entusiasmo.
Seiji me deu um empurrão amigável no ombro, com seu sorriso largo e encorajador.
— Estamos torcendo por você — disse Seiji. Com um último sorriso de incentivo, eles se despediram e foram embora.
Quando eles saíram, fiquei um momento parado, refletindo sobre o que havia acabado de acontecer. Meus amigos me apoiavam, o que me dava um pouco mais de coragem.
A escola estava barulhenta, ainda com muitas conversas e risos. Eu precisava de um lugar mais silencioso para me concentrar. As conversas ao meu redor se transformaram em um murmúrio distante enquanto pensava em um refúgio. A biblioteca parecia o lugar perfeito. Peguei a chave na sala dos professores e me dirigi até lá
Quando cheguei, senti uma onda de alívio. A biblioteca estava quase deserta, um santuário de tranquilidade em meio ao caos da escola. Escolhi uma mesa perto da janela. Sentado ali, comecei a reler a história que havia escrito até agora, tentando encontrar pontos a melhorar ou desenvolver.
Enquanto pensava no que escrever, meus olhos foram atraídos para o campo de atletismo. Os membros do clube estavam praticando, e para minha surpresa, vi Yuki entre eles. Eu não sabia que ela fazia parte do clube, mas agora que pensava, fazia sentido. Ela sempre se destacava nas aulas de educação física. Observá-la me deixou fascinado; ela corria com uma graça e uma determinação que eu nunca tinha notado antes, como se estivesse perseguindo algo.
— Yuki, a respiração! — alguém do clube gritou, enquanto ela corria.
— Continue firme! — disse outro
Me peguei sorrindo ao ver o esforço e a dedicação dela. Mas logo me lembrei do caderno à minha frente e da história que eu deveria estar trabalhando. Olhei para as páginas em branco e suspirei.
— Droga, me distraí... — murmurei para mim mesmo, tentando voltar ao trabalho.
Escrevi algumas linhas, mas não consegui parar de pensar em Yuki. Decidi que precisava de uma mudança de ambiente para clarear a mente, então arrumei minhas coisas e saí da biblioteca.
Enquanto caminhava pelos corredores vazios, pensei em como era estranho estar escrevendo uma história. Era algo tão novo para mim, algo que nunca imaginei fazer. Se eu não tivesse ligado para Rintarou naquele dia, eu provavelmente estaria em casa jogando ao invés de estar tentando escrever algo.
Enquanto caminhava para casa, o céu estava tingido de um belo tom de laranja pelo pôr do sol. As ruas estavam movimentadas, cheias de pessoas indo e vindo, conversando e rindo. Era uma cena reconfortante.
Quando cheguei em casa, cumprimentei minha família e fui direto para o quarto. Sentei-me na escrivaninha, pronto para continuar escrevendo e tentar encontrar o fio que conectava todas as ideias da história, mas fui interrompido por vozes na sala de estar.
Curioso, me aproximei silenciosamente da escada e fiquei escutando.
— Oh, você voltou — Ouvi a voz da minha mãe, calorosa mas surpresa.
— Sim, consegui um tempo livre! — A voz era familiar, mas não consegui identificar de imediato.
Intrigado, desci as escadas, pensando que poderia ser algum conhecido da minha mãe. Quando cheguei à sala, meus olhos se arregalaram. Era meu pai, sentado no sofá, com um sorriso calmo. Hana estava animada ao seu lado, segurando sua mão.
— Pai...? — minha voz saiu num sussurro incrédulo.
Ele tinha se mudado para uma cidade distante há algum tempo, para trabalhar em uma empresa. Tinha tentado nos convencer a nos mudar com ele, mas a vida aqui era boa, e mudar parecia difícil e desnecessário.
— Olá, Shin. — Ele sorriu, mas havia um cansaço em seus olhos. — Desculpe aparecer assim, de repente.
— O que você está fazendo aqui? — perguntei, tentando manter a voz firme, mas sentindo um nó de nervosismo.
— Consegui uma folga no trabalho e achei que era uma boa oportunidade para visitar — ele explicou, forçando um sorriso que não alcançava seus olhos. Havia um cansaço profundo ali, algo que eu não via desde antes de ele partir. Talvez ele estivesse lutando para encontrar as palavras certas ou tentando esconder a verdadeira razão de sua visita. Senti um misto de confusão e ressentimento, lembrando de todas as promessas de visitas que ele nunca cumpriu.
Minha mãe, tentando aliviar a tensão, sugeriu que saíssemos para jantar e comemorássemos o retorno do meu pai. Concordei com um aceno, ainda processando a presença dele ali.
— Vamos jantar fora hoje para comemorar, então! — anunciou minha mãe.
No caminho para o restaurante, permaneci em silêncio, imerso em pensamentos. A relação com meu pai sempre foi cordial, mas distante. Na última vez que estivemos tão próximos, foi para uma despedida apressada na estação de trem. Desde então, nossas conversas se resumiam a breves ligações e mensagens formais, cheias de 'como vai?' e 'está tudo bem?'. Ele tentou disfarçar o desconforto com uma piada, mas o silêncio que se seguiu falou mais alto do que qualquer palavra.
O restaurante era aconchegante, com uma luz suave que criava uma atmosfera acolhedora. Nos sentamos perto de uma janela, de onde podíamos ver as luzes da cidade começando a brilhar. Hana estava animada, folheando o cardápio, enquanto minha mãe e meu pai discutiam suas opções. Eu estava quieto, ainda tentando entender a súbita presença do meu pai.
Enquanto olhávamos os cardápios, minha mãe trouxe um copo de água para mim.
— Eu trouxe água — disse ela, colocando o copo na minha frente.
— Obrigado — respondi, distraído, enquanto examinava as opções do menu.
Hana estava animada, folheando o cardápio e discutindo com o pai sobre o que iria escolher.
— Quero este aqui! — exclamou, apontando para uma foto de uma sobremesa enorme.
— Calma, Hana. Vamos escolher o prato principal primeiro. — meu pai respondeu, rindo.
—...
— Então... você tem estado ocupado na escola? — meu pai perguntou, casualmente enquanto olhava o cardápio.
— É... um pouco — murmurei, brincando com meu guardanapo.
Hana, sempre animada, aproveitou a oportunidade para se gabar.
— O Shin está escrevendo uma história! — exclamou, com os olhos brilhando de entusiasmo.
Meu pai ergueu as sobrancelhas, surpreso, e pousou o cardápio.
— Sério? Do que se trata? — perguntou, com uma curiosidade sincera na voz.
Eu me senti um pouco desconfortável com o foco sobre mim, então dei de ombros.
— Ainda não sei direito... só umas ideias que estou tentando colocar no papel — disse, tentando manter a conversa leve.
O garçom chegou com nossos pedidos, e a conversa foi interrompida. Enquanto comíamos, meus pais conversavam sobre o trabalho e como minha mãe estava administrando tudo em casa. Tentei me envolver na conversa, mas minha mente estava em outro lugar.
Enquanto todos comiam ouvi uma voz familiar na mesa ao lado. Olhei discretamente e não pude acreditar. Vi Yuki, sentada com sua família. Por um momento, nossos olhares se encontraram. Senti meu coração acelerar e rapidamente desviei o olhar, tentando agir naturalmente.
O que ela estaria fazendo ali? A coincidência de estarmos no mesmo restaurante me deixou com um leve desconforto
— Vou pegar algo para beber no drink bar — anunciei, levantando-me. Precisava de um momento para me recompor.
No drink bar, olhei as opções de bebidas. Estava prestes a pegar um refrigerante quando Yuki apareceu ao meu lado. Ela também ia beber algo. Troquei um breve aceno de cabeça com ela, sentindo uma onda de nervosismo. Tentamos não parecer conscientes da presença um do outro, mas a tensão era palpável, como uma corda esticada prestes a quebrar
Para tentar parecer mais maduro, decidi pegar um café preto, embora não gostasse muito. Peguei o copo e dei um gole, mas esqueci de colocar açúcar.
O sabor amargo quase me fez engasgar, mas me controlei para não fazer uma careta na frente dela.
— Ei Yuki, pode pegar para nós também? O de sempre, por favor. — ouvi a voz de alguém da família dela. Ela assentiu e começou a encher mais copos.
Enquanto ela enchia mais copos, fiquei ao lado dela, tentando não parecer nervoso. Quando ela terminou, trocamos outro breve aceno antes de eu voltar para a minha mesa. Meu pai notou a interação e sorriu.
— Quem era aquela garota? — perguntou, curioso.
— Uma colega de classe — respondi, tentando minimizar a situação.
— Ah, ela é bonitinha — comentou ele, sorrindo.
— Querido, não diga isso — minha mãe o repreendeu, rindo. Eu apenas balancei a cabeça, sentindo minhas bochechas ficarem vermelhas.
Enquanto terminávamos de comer, meus pais conversavam sobre o trabalho de meu pai e as novidades da cidade. Hana estava animada, contando histórias da escola. E eu estava quieto, perdido em pensamentos. Meus olhos, constantemente atraídos para a mesa ao lado, onde Yuki estava sentada com sua família, não conseguiam se fixar no prato à minha frente.
Cada vez que nossas olhares se encontravam, meu coração dava um salto, e eu rapidamente desviava o olhar, fingindo interesse em qualquer outra coisa. Ela parecia tão à vontade, sorrindo e conversando, enquanto eu me sentia um intruso em minha própria vida.
Depois de terminarmos de comer, enquanto meus pais pagavam a conta, Yuki se afastou da sua família e se aproximou de mim. Ela mostrava um leve nervosismo, mas havia uma firmeza em seu olhar.
— Shin... não conte para ninguém sobre hoje, tá? — Ela desviou o olhar, uma leve cor surgindo em suas bochechas. — É meio constrangedor... — completou com um sorriso nervoso, os olhos evitando os meus.
— Claro, não vou contar — respondi rapidamente, tentando esconder minha surpresa por ela estar falando comigo tão diretamente. Era raro vê-la tão vulnerável, e isso me fez perceber o quão pouco eu realmente a conhecia. Senti uma onda de empatia, mas também de nervosismo.
— Obrigada — ela respondeu, dando-me um leve sorriso antes de voltar para sua família. Observei-a sair, ainda sentindo o coração bater um pouco mais rápido.
"Mas isso não te constrange?" pensei, enquanto olhava para Yuki sair, ainda usando seu uniforme do clube de atletismo.
De volta ao carro, meu pai sugeriu que fôssemos ao parque no fim de semana, algo que não fazíamos há muito tempo. Concordei, mais por cortesia do que entusiasmo, ainda processando o retorno dele.
No dia seguinte, enquanto caminhava pelos corredores em direção á sala de aula com Seiji e Rintarou, avistei Yuki prestes a entrar na sala, ela parou e olhou para mim brevemente, e então entrou na sala, sem dizer uma única palavra.
Desde então, não conversei mais com ela, embora tivéssemos nos notado algumas vezes.
Quando a aula estava prestes a acabar, o professor começou a explicar sobre as tarefas do festival esportivo que aconteceria em breve.
— Então, agora que terminamos a atribuição de tarefas, haverá instruções depois das aulas para cada grupo. Depois dos anúncios, cada grupo se reunirá em salas separadas e...
Eu estava tão distraído pensando na história que não prestei atenção em nada.
Quando as aulas terminaram, fui falar com Rintarou para entender o que eu deveria fazer. Fui designado para o grupo de equipamentos.
Assim que todos do grupo se reuniram na sala, um aluno começou a falar.
— Agora que todos estão aqui, gostaria de começar. Eu sou Hiroshi do clube de atletismo. Nós seremos responsáveis pelo grupo de equipamentos, então eu gostaria de pedir a ajuda de vocês com isso.
Enquanto ele falava, notei do outro lado da sala a Yuki, e ela parece ter me notado também. Tentei lutar contra mim mesmo para não desviar o olhar mas não consegui resistir. Não conseguia olhar diretamente para ela, talvez fosse por que não nos falamos desde o dia do restaurante e agora apenas trocávamos olhares, mesmo ela sentando do meu lado durante as aulas.
Quando Hiroshi havia acabado de falar e tudo estava decidido, fomos liberados para ir para casa.
Depois da reunião, Akira e Takeshi vieram falar comigo sobre formar um grupo para organizar as atividades. Eles me pediram para pegar os contatos dos membros que estavam presente na reunião.
— Ei, Shin, nós fizemos um grupo com os membros da nossa turma no ano passado. Facilitou bastante as coisas! — disse Takeshi.
— Você pode pegar os contatos de todos para a gente, por favor, Shin? — implorou Akira.
— Tá... — respondi sem pensar muito.
Hiroshi chamou os dois para conversarem, e enquanto eu estava no corredor fiquei pensando no que eles haviam acabado de falar. Se eu tivesse que pegar o contato de todos, isso incluiria a Yuki. Fiquei nervoso só de pensar nisso. Sabia que teria que falar com ela, mas ainda não tinha coragem.
Antes nós falávamos, mesmo que fosse apenas um cumprimento matinal, mas agora nós não trocávamos sequer uma palavra, apenas olhares, pedir o contato dela seria algo impossível para mim.
Chegando em casa, fui direto para o meu quarto e me joguei na cama. Peguei meu celular e fui adicionando no grupo os contatos que eu já tinha guardado.
— Agora só falta o contato dela...
No dia seguinte, eu tentava ler os meus rascunhos na sala antes da aula começar, rodeado de barulho de conversas de Kazuki com colegas de classe conversando.
— Ei Kazuki, você viu minha mensagem? Você nunca responde!
— Foi mal, estava ocupado — disse ele, sorrindo
— Não acredito nisso.
— Eu já pedi desculpas...
Enquanto lia os rascunhos pensando em como a história poderia ser melhorada, senti alguém olhando para mim, inclinei minha cabeça para cima e vi que era Yuki. Nós nos olhamos, e eu pensei ser esse o momento perfeito para pedir o contato dela para o grupo. Enquanto reunia coragem para falar, alguém chamou Yuki.
— Yuki, eu...
— Ei, Yuki, vem no banheiro comigo, por favor! — chamou alguém na porta.
— E-estou indo! — respondeu ela
Tinha perdido a chance de pedir o contato dela, mas não fiquei desanimado, ainda haveriam outras chances.
No final do dia, enquanto caminhava de volta para casa, vi uma pequena biblioteca que nunca tinha notado antes. Talvez ler um livro poderia me ajudar a dar ideias para a minha história. Na porta da biblioteca havia um aviso dizendo que eles estavam contratando. Entrei, curioso, e fui recebido por um jovem no balcão, que parecia ser apenas alguns anos mais velho que eu.
— Bem-vindo! — disse ele
Enquanto olhava pela biblioteca, tentando encontrar algo que despertasse a minha curiosidade, vi uma revista interessante para adultos, eu estava na puberdade, não seria estranho eu pegar essa revista, eu acho. Mas eu morreria de vergonha se eu passasse no balcão para comprar aquilo e, além disso, eu estava ali para procurar um livro para ler, não uma revista.
Enquanto caminhava pela velha biblioteca, lembrei-me do livro que a Kaori tinha mencionado no dia em que fui para o clube de literatura, ela disse que eu iria gostar, então poderia me ajudar na escrita, eu achei o livro e li a sinopse na contracapa, parecia realmente ser interessante.
— Esse é um bom livro — disse a pessoa do balcão, se aproximando de mim
— Ah, me recomendaram ele, disseram que era realmente bom então decidi dar uma vista de olhos — respondi.
— A história de um grupo secreto que tentam derrubar um império distópico e se estabelecer em mundo coberto de cinzas é simplesmente incrível, tenho certeza que você vai gostar! — disse ele animado.
— Então vou levar esse! — respondi, interessado no livro
Enquanto caminhávamos para o balcão, ele voltou e pegou algo.
— Este é por minha conta — disse ele enquanto colocava em um saco a revista que eu havia olhado mais cedo.
— Hã?! E-eu não... — eu disse tentando recusar.
— Relaxa, você deve ler todo o tipo de coisas! — disse ele rindo.
Fiquei hesitante por um momento, mas decidi aceitar a sua oferta. Peguei o livro e a revista, e saí com a cabeça cheia de ideias. Enquanto caminhava de volta para casa, não conseguia parar de pensar na possibilidade de trabalhar naquela biblioteca. A ideia de estar cercado de livros todos os dias, explorando novas histórias e talvez encontrando inspiração para a minha própria escrita, me parecia cada vez mais atraente.
Ao chegar em casa, o aroma familiar do jantar me recebeu. Minha mãe estava na cozinha, preparando algo especial, e o som da televisão preenchia a sala. Subi para o meu quarto, onde deitei na cama com o livro que havia acabado de comprar. Folheando as páginas, tentei me concentrar, mas minha mente vagava entre pensamentos sobre o trabalho e as recentes mudanças em minha vida.
Assim, pensei sobre tudo o que havia acontecido e sobre o que estava por vir. A escrita, Yuki, meu pai de volta em casa... tudo parecia um tanto quanto surreal, mas eu estava ansioso para ver onde essas novas experiências me levariam.
O que eu havia escrito parecia insignificante comparado à avalanche de mudanças em minha vida. Fechei os olhos, imaginando o futuro — não o futuro distante, mas o dia seguinte, a próxima página, o próximo encontro com Yuki. Havia uma nova energia em mim, uma fome por algo mais, algo que eu ainda não conseguia definir.
A escola parecia mais movimentada do que o normal, com o som das conversas animadas dos alunos ecoando pelos corredores. O céu estava limpo, e a luz do sol entrava pelas janelas, dando um tom dourado aos pisos de mármore.
Eu cheguei um pouco mais cedo, o que era incomum, mas a ansiedade de completar a tarefa dada por Akira e Takeshi me mantinha acordado. Caminhei pelos corredores até encontrar Akira perto das máquinas de refrigerante, onde ele geralmente se reunia com o grupo antes das aulas começarem.
— Bom dia, Shin! — ele acenou para mim, com seu habitual sorriso entusiasmado. — Como está indo o grupo?
— Bom dia, Akira — cumprimentei, tentando parecer mais confiante do que realmente estava. — Quase todos estão no grupo. Só falta a Yuki.
— A Yuki? Hm, achei que ela já estivesse lá. — Akira levantou uma sobrancelha, surpreso. — Ela é sempre a primeira a se envolver nessas coisas. Obrigado por cuidar disso, sei que você tem se esforçado.
— Não foi nada. — Eu dei de ombros, tentando parecer despreocupado. — Mas, pra ser honesto, ainda não consegui falar com ela. Ela parece sempre ocupada com o clube ou estudando.
— É, a Yuki é bem dedicada. — Akira assentiu, com um sorriso conhecedor. — Sabe, se precisar de ajuda para falar com ela, posso tentar dar um toque. Só não fique nervoso, ela é legal.
— Ah, não precisa. Eu dou um jeito. — Sorri, embora internamente estivesse torcendo para que ele realmente ajudasse. A ideia de abordá-la soava mais fácil na teoria do que na prática.
Akira se despediu, deixando-me sozinho com meus pensamentos. Decidi caminhar um pouco pela escola, enquanto as aulas não começavam, quem sabe para encontrar uma oportunidade de falar com Yuki. Enquanto passava pelos corredores, meus pensamentos estavam divididos entre a missão de completar o grupo e o nervosismo de interagir com Yuki. Sempre me sentia um pouco deslocado quando estava perto dela, talvez por causa de sua atitude séria e focada. Ela sempre parecia tão dedicada ao atletismo e aos estudos, o que fazia com que eu me sentisse um pouco mais inseguro sobre minha própria falta de direção.
Enquanto descia as escadas em direção ao andar inferior, as vozes ecoavam pelo corredor de azulejos brancos, típicos da área de educação física. O cheiro familiar de madeira encerada e o leve odor de cloro da piscina próxima me atingiram, me lembrando dos longos dias de educação física.
À minha frente, avistei Yuki conversando com o professor de educação física, ao lado de um grande mural colorido que exibia fotos dos eventos esportivos passados. Yuki segurava uma prancheta azul, suas mãos pequenas mas firmes enquanto anotava cuidadosamente as informações. O professor, um homem de meia-idade com cabelos grisalhos e uma camiseta do time da escola, falava sobre o cronograma de treinamento para o clube de atletismo. A expressão concentrada de Yuki contrastava com o ambiente ligeiramente caótico ao redor, onde outros alunos passavam carregando equipamentos de esportes e mochilas volumosas.
Pensei em abordá-la, mas não queria interromper a conversa. Esperei pacientemente até o professor se afastar, dando uma última olhada nas anotações dela. Quando o professor saiu, segui Yuki até uma sala de depósitos.
Aproximei-me devagar, respirando fundo para acalmar os nervos. Minhas mãos estavam suadas, e meu coração batia tão forte que parecia que todos podiam ouvir. "Calma, Shin. É só pedir o contato dela. Não é nada demais", pensei, tentando convencer a mim mesmo de que era uma tarefa simples. Mas, por alguma razão, minha mente só conseguia pensar em todos os jeitos que isso poderia dar errado. E se ela achasse estranho? E se eu parecesse um idiota? Quando cheguei perto o suficiente, chamei seu nome:
— Yuki? — chamei, tentando parecer casual, mas minha voz saiu mais alta do que pretendia. "Ótimo, agora ela deve achar que sou algum tipo de maluco."
Ela se virou rapidamente, claramente surpresa, mas logo relaxou ao me reconhecer.
— Ah, Shin... você me assustou — disse ela, colocando a mão no peito e soltando um suspiro. "Ela está sorrindo... Isso é bom, certo? Talvez eu não tenha estragado tudo. Ok, foco, é só pegar o contato dela e sair. Não precisa tornar isso mais complicado do que já é"
— Desculpa, não queria assustar você. — Eu cocei a nuca, nervoso. — Eu só... preciso pegar seu contato para o grupo. Estou ajudando Akira e Takeshi a organizar as coisas para o festival esportivo, sabe?
Yuki piscou algumas vezes, parecendo pensar.
— Ah, claro. — Ela olhou para os lados, como se procurasse algo. — Mas, não estou com meu celular agora... Você se importaria de esperar até depois da aula?
Senti um breve momento de pânico, pensando em como poderia completar logo essa tarefa, sem demorar muito mais tempo. Mas então, me ocorreu uma solução.
— Ah, não tem problema. Pode anotar seu número aqui? — Ofereci a ela uma caneta e um pedaço de papel.
Ela assentiu e anotou seu número, enquanto eu observava, tentando não parecer muito interessado. Ela me entregou o papel e sorriu.
— Pronto — disse ela, me entregando o papel — Me avise se precisar de mais alguma coisa.
— Obrigado — respondi, guardando o papel com cuidado no bolso.
Enquanto isso, notei que ela estava movendo algumas caixas pesadas para organizar os materiais do clube. Parecia um trabalho cansativo, e me senti mal em deixá-la fazer tudo sozinha.
— Quer ajuda com isso? — ofereci, olhando para as caixas.
— Não precisa, eu consigo — disse ela, um pouco hesitante.
— Vai ser mais rápido se eu ajudar — insisti, pegando uma caixa mais próxima. — E vou me sentir mal se não ajudar.
Começamos a mover as caixas juntos, e o trabalho se revelou mais difícil do que eu esperava. As caixas estavam cheias de equipamentos de atletismo, e a poeira acumulada indicava que não eram mexidas há algum tempo. O ar estava levemente abafado, e uma fina camada de poeira se levantava a cada movimento, tornando o ambiente um pouco sufocante.
— O que tem aqui dentro? — perguntei, tentando aliviar a tensão.
— Equipamentos antigos, talvez algumas lembranças de anos passados — respondeu Yuki, enquanto limpava o suor da testa. — Sempre que podemos, organizamos tudo para não acumular.
Houve um momento de silêncio, e eu me vi buscando desesperadamente um tópico de conversa. Queria aproveitar a oportunidade para conhecê-la melhor, mas as palavras pareciam fugir. Finalmente, me lembrei de algo.
— Então, você está no clube de atletismo há muito tempo?
Yuki assentiu, focada em mover outra caixa. — Sim, desde o primeiro ano. É uma das minhas paixões.
— Isso é incrível. Nunca fui bom em esportes... na verdade, sempre fui mais de jogos e coisas assim. — Admiti, sentindo uma pontada de vergonha.
Ela sorriu, desta vez com mais naturalidade. — Cada um tem suas habilidades. O importante é encontrar algo que goste de fazer.
Nesse momento, percebi uma mancha de poeira no ombro dela. Sem pensar, estendi a mão para limpar.
— Ah, desculpa! — disse rapidamente, percebendo o que tinha feito. — Não queria te tocar sem querer...
Yuki olhou para o ombro e depois para mim, com uma expressão surpresa que logo se suavizou. — Tudo bem, Shin — disse ela, com um sorriso que parecia aquecer a sala. — Obrigada.
Terminamos de mover as caixas e ficamos por um momento em silêncio, recuperando o fôlego. Ela me agradeceu novamente, e enquanto ela se afastava, não pude deixar de sentir uma estranha mistura de satisfação e ansiedade. Eu tinha conseguido interagir com ela de forma mais natural do que esperava, e isso me deu uma sensação de esperança.
Com o toque de saída soando pelo corredor, senti o peso do dia começar a se dissipar. Passei pelo pátio da escola, agora esvaziando enquanto os alunos se dirigiam para suas atividades da tarde. O céu estava tingido de um laranja suave, prenunciando o fim do dia. O ar fresco parecia trazer uma nova perspectiva, e um leve sorriso se formou em meu rosto ao lembrar da expressão gentil de Yuki.
De volta ao meu quarto, a luz do fim da tarde entrava pelas cortinas, criando um ambiente acolhedor. Sentei-me à escrivaninha e peguei o papel com o número de Yuki. Adicionei-a ao grupo de mensagens, esperando ansiosamente para ver sua reação. Olhei para a foto de perfil dela — um adorável cachorro. Era uma escolha inesperada para alguém tão focada como ela, e isso me fez sorrir. Comecei a imaginar como poderia iniciar uma conversa com ela, talvez sobre a foto dela ou sobre o clube de atletismo.
Meus devaneios foram interrompidos quando minha irmã mais nova, Hana, entrou no quarto sem bater.
— Ei, quem é essa? — perguntou ela, espiando por cima do meu ombro. — É sua namorada?
Dei um salto, quase derrubando o celular.
— Hana! — exclamei, tentando esconder a tela. — Não é nada disso!
Ela riu, claramente se divertindo com a minha reação.
— Calma, eu só estava brincando. Até porque é mais fácil ganhar na loteria do que você arranjar uma namorada. — disse ela, provocando. — Até outro dia, você só se importava com jogos!
Tentei conter a vergonha e a irritação que subiam pelo meu rosto.
— Sai do meu quarto! — falei, empurrando-a gentilmente para fora. — Estou tentando fazer algo importante.
Hana saiu, ainda rindo, e fechei a porta atrás dela, sentindo o coração bater acelerado. Sentei-me novamente, tentando recuperar a compostura. Meus pensamentos voltaram para Yuki e para o grupo. Fiquei olhando para a tela, pensando nas possíveis conversas que poderíamos ter. Havia algo de intrigante nela que me fazia querer conhecê-la melhor. Talvez fosse o jeito sério e dedicado ou talvez fosse a inesperada escolha da foto de perfil. De qualquer forma, sabia que queria mais interações com ela.
Enquanto a noite caía e as mensagens do grupo começavam a pipocar na tela, dei uma última olhada para o contato de Yuki antes de guardar o celular. Senti um misto de excitação e ansiedade pelo que estava por vir. O festival esportivo estava se aproximando, e com ele, a promessa de novas experiências e, quem sabe, de novas amizades. E assim, mais uma vez, me peguei sonhando acordado, perdido em pensamentos sobre o futuro.
Era de madrugada. Eu estava na minha escrivaninha, com a lâmpada acesa, tentando encontrar ideias para a minha história. Escrever se revelava mais difícil do que eu pensava. O papel em branco parecia zombar de mim, enquanto eu rabiscava palavras que logo riscava. Meus olhos pesavam, mas eu não podia parar.
Acabei cochilando por alguns minutos, a cabeça caindo sobre o caderno. Quando acordei, o sol começava a nascer, tingindo o céu de tons alaranjados. O cansaço me envolvia como um cobertor pesado, mas me levantei e desci para tomar café.
Na cozinha, minha mãe estava preparando o café da manhã. Quando me viu, notou minhas olheiras imediatamente.
— Você andou ficando acordado até tarde, não é? — ela comentou, uma preocupação suave na voz.
Eu apenas assenti, ainda meio atordoado.
Meu pai estava à mesa, lendo o jornal. Tentei ignorar a presença dele, mas foi difícil. Minha mãe me entregou o almoço, perguntando sobre o festival desportivo que se aproximava.
— Você quer que a gente vá? — perguntou, com Hana parecendo interessada.
Minha irmã Hana parecia ansiosa com a ideia, mas a ideia de ter minha família na plateia me enchia de vergonha por algum motivo.
— Não precisa, mãe. É só um festival escolar — respondi, olhando para o chão.
Meu pai abaixou o jornal e olhou para mim.
— Você anda dormindo até tarde porque está escrevendo, não é? — perguntou, pegando-me de surpresa.
Respondi hesitante:
— Sim...
— Está tudo bem. Eu também costumava escrever — disse ele, com um sorriso nostálgico.
Eu fiquei visivelmente surpreso. Não esperava que meu pai tivesse interesse por escrita no passado. Isso me fez sentir uma conexão inesperada com ele.
Na escola, o festival desportivo já estava para começar, transformando o campo em um turbilhão de cores e sons. O ar estava repleto de gritos e aplausos vindos das bancadas lotadas, onde os pais acenavam com bandeirinhas e os colegas torciam com entusiasmo.
Os corredores masculinos se preparavam, ajustando suas faixas de cabeça e alongando os músculos. Eu estava com Seiji e Rintarou, e outros colegas de classe, todos eles ansiosos e energizados pelo ambiente vibrante. As risadas e conversas animadas ao nosso redor criavam uma atmosfera eletrizante, menos para mim.
— A equipe vermelha vai vencer este ano! — disse Seiji animado, amarrando uma faixa vermelha na cabeça.
Aiko se aproximou, sorrindo.
— Na verdade, o time azul vai ganhar — disse ela.
— Ei, qual é gente, todos sabem que na verdade o time amarelo vai ganhar — disse Akira rindo, se aproximando deles
Seiji deu uma risada e olhou para Akira.
— Está se achando só porque ganhou de mim naquela corrida na piscina, né? — ele provocou. — Mas hoje vou te mostrar o que é velocidade de verdade!
Akira respondeu com um sorriso desafiador.
— Hoje é o dia decisivo. Vamos ver quem realmente manda!
Aiko observava os dois com um sorriso divertido, enquanto o clima de competição crescia entre eles.
— Espero que vocês tenham guardado energia, porque essa disputa vai ser épica! — disse ela, incentivando ainda mais a rivalidade amigável.
Enquanto eles estavam animados, eu estava totalmente sem energia. Acabei por soltar um bocejo, que Rintarou logo notou e perguntou:
— Você ficou jogando até tarde de novo, Shin?
Balancei a cabeça.
— Não, estive escrevendo. Aquela história que vocês leram, sabe?
Rintarou suspirou e colocou uma mão no meu ombro, apertando levemente. Seus olhos refletiam uma preocupação que suas palavras tentavam minimizar.
— Oh, entendo. Mas você não precisa se forçar tanto, Shin. É só a sua primeira história, não precisa ser perfeita — disse Rintarou, claramente preocupado mesmo que sua cara não mostrasse isso.
— Eu sei mas eu quero ganhar o prêmio do concurso — respondi, determinado.
— Concurso? que concurso? — perguntou Rintarou, surpreso.
— Um concurso de escrita para novatos. Minha história é boa, tenho certeza que vou ganhar.
Seiji ouviu o que eu disse e junto com Rintarou, eles ficaram surpresos. Eles pediram para ler novamente a história, mas eu recusei, envergonhado.
— Qual é? Deixa a gente ler — disse Seiji, rindo e fazendo cócegas em mim.
— Ei, para com isso! — respondi, rindo também.
A chamada para as corredoras dos 200 metros foi anunciada. A torcida gritava em apoio. Observei a pista e vi Yuki. Ela parecia tão linda, especialmente com o seu cabelo amarrado.
— Em suas marcas... preparar... vai!
Elas começaram a correr. Yuki liderava, correndo tão rápido e graciosamente que meu coração bateu mais forte. Ela conseguiu ganhar a corrida com tanta facilidade que não pude deixar de ficar admirado.
Seiji então percebeu meu olhar fixo nela.
— Se continuar olhando assim, ela vai perceber que você gosta dela — disse ele, rindo.
— Tá falando sério? — perguntei, tocando o rosto, tentando mudar minha expressão.
Fiquei envergonhado e saí dali, dizendo que ia cuidar dos equipamentos para a próxima modalidade. Enquanto arrumava a corda para o cabo de guerra, vi Kazuki conversando com Yuki.
— Me compra uma bebida se o time azul ganhar — disse ele.
— Hã? Sem chance — respondeu Yuki, sorrindo.
— Pode ser uma água então.
— Você está bem confiante de que vai ganhar, Kazuki — disse ela, rindo.
— É claro, não tem como eu perder essa corrida — respondeu ele
— Então, se o seu time ganhar, eu compro um suco para você — disse ela, aceitando a aposta com um sorriso.
Eu observei a cena de longe, sentindo uma pontada de inveja e tristeza. Por que eu não conseguia falar com Yuki com a mesma facilidade que Kazuki? Parecia que, para ele, tudo era tão natural. Eles riam juntos, compartilhando momentos que eu só podia imaginar. Cada sorriso de Yuki para Kazuki era como uma agulha perfurando minha autoconfiança.
Meus pensamentos começaram a girar. "O que há de errado comigo?" perguntei-me. "Por que minhas palavras sempre parecem se enrolar e me trair quando tento falar com ela?" Lembrei-me de todas as vezes que tentei iniciar uma conversa e falhei miseravelmente. Minhas mãos suavam, minha garganta secava e tudo o que eu conseguia fazer era gaguejar.
Eu também queria ser parte daquele mundo, compartilhar risadas e conversas despreocupadas. Mas, ao invés disso, me via preso em um ciclo de insegurança e silêncio. A escrita era o único lugar onde eu podia expressar meus pensamentos e sentimentos sem medo de julgamento. Porém, no mundo real, diante de Yuki, eu era apenas alguém tímido e desajeitado.
Eles continuavam conversando, e eu voltei a focar na corda, tentando afastar os pensamentos negativos. A inveja queimava em meu peito, misturada com um sentimento de inadequação que eu não conseguia superar. Sentia-me sozinho, mesmo cercado por amigos, e aquela cena só tornava tudo mais evidente.
Voltei para junto de Seiji, Rintarou e a turma, cabisbaixo
O cabo de guerra começou. Estava acirrado, com gritos de "Vamos, puxem com mais força!" de um lado e "Não vamos perder!" do outro. O time vermelho acabou ganhando. Seiji fez uma careta para Aiko, que ficou nervosa.
Era então chegado a hora dos 200 metros masculinos. Fiquei nervoso. Eu nem queria competir, mas fui meio que forçado a me inscrever, eu tinha que participar em pelo menos uma atividade do festival.
— Sua vez chegou, Shin — disse Rintarou.
— Infelizmente, sim. Vou indo.
— Tente não tropeçar, Shin! — disse Seiji, rindo.
Enquanto caminhava até as posições dos corredores, lembrei-me da vez no fundamental em que tropecei no meu cadarço e caí, na frente de todos, durante a corrida de 100 metros. Foi uma memória vergonhosa que, por algum motivo, nunca consegui esquecer.
Chegando na marca, vi que Kazuki estava ao meu lado. Decidi levar a sério. Queria ganhar na frente dos meus amigos, colegas de classe e principalmente na frente da Yuki. Meu coração batia acelerado, como se quisesse sair do peito. Senti uma mistura de ansiedade e determinação.
— Em suas marcas... preparar... vai!
Todos começaram a correr. O chão tremia sob os meus pés enquanto eu me lançava para frente, tentando acompanhar o ritmo de Kazuki. A torcida vibrava ao nosso redor, mas o som parecia distante. Tudo o que eu conseguia ouvir era o som da minha própria respiração e os batimentos rápidos do meu coração.
Kazuki saiu na frente, suas pernas se movendo com uma precisão quase mecânica. Eu lutava para manter a velocidade, sentindo os músculos das pernas queimarem a cada passo. Olhei rapidamente para o lado e vi Seiji e Rintarou me apoiando com gritos encorajadores, mas a distância entre mim e Kazuki só aumentava.
Enquanto corria, fui ultrapassado por um corredor do time amarelo. Um nó de frustração se formou no meu estômago. Estava tão focado em tentar alcançar Kazuki que nem reparei que meu cadarço estava desamarrado. Pisei nele e, em um instante, meu corpo foi projetado para frente. O mundo parecia andar lentamente enquanto eu caía, o chão se aproximando cada vez mais.
"De novo não, essa vergonha outra vez não..." pensei. O impacto foi duro, mas a adrenalina não me deixou desistir. Levantei-me rapidamente, ignorando a dor que se espalhava pelo corpo, e continuei a correr. A torcida ao longe parecia em câmera lenta, mas os gritos de Seiji e Rintarou me puxavam de volta à realidade. Suas vozes eram um farol de apoio em meio à minha confusão.
Kazuki cruzou a linha de chegada em primeiro lugar, seguido pelo corredor do time amarelo. Mesmo assim, ainda consegui o terceiro lugar. Meu corpo estava exausto, mas uma pequena vitória interna me fez continuar de pé.
Kazuki apontou para Yuki e sorriu. As pessoas ao redor dela começaram a especular se eles estavam namorando. Fiquei com uma tristeza enorme ao ver a cena, e com uma tristeza ainda maior pela minha queda na frente dela e dos meus colegas. Caminhei até a enfermaria, olhando para baixo, evitando o olhar de todos. Cada passo parecia um peso adicional em meu coração.
Rintarou e Seiji vieram atrás de mim. Rintarou se aproximou, com uma expressão séria que logo se suavizou num pequeno sorriso encorajador. Ele deu um leve soco no meu ombro.
— Ei, Shin, não esquenta com isso. Você foi incrível lá fora.
Seiji, ao lado dele, soltou uma risada e deu um tapinha nas minhas costas, quase me fazendo perder o equilíbrio.
— É, todo mundo tropeça de vez em quando. Você ainda conseguiu o terceiro lugar! — disse ele, piscando um olho para mim.
Agradeci o apoio deles com um sorriso fraco e continuei meu caminho. Dirigi-me à enfermaria para desinfetar o joelho e colocar um curativo. Quando cheguei lá, para minha surpresa, encontrei Aiko.
Ela olhou para mim por um momento, pensativa, e então seu rosto se iluminou.
— Oh! Shin, certo? — perguntou ela, confirmando o meu nome.
— Ah, isso — respondi, meio surpreso que ela lembrasse.
— O que você veio fazer aqui? — perguntou ela
— Vim desinfetar e colocar um curativo — expliquei, mostrando o machucado.
Aiko sorriu gentilmente.
— Deixe-me ajudar com isso.
Sentei-me e deixei que ela cuidasse do meu ferimento. Enquanto ela me tratava, um silêncio confortável se instalou. Aiko era habilidosa e cuidadosa, o que me fez sentir um pouco menos constrangido com a situação.
No meio do silêncio, ela finalmente quebrou o gelo.
— Vi o que aconteceu na pista de corrida — disse ela, suavemente.
Fiquei com vergonha e virei a cabeça, tentando evitar seu olhar.
— Não se preocupe. Eu mesma já caí muitas vezes. Cair não é motivo de vergonha, mas não levantar e desistir é que é.
Aquelas palavras me pegaram de surpresa. Aiko continuou, enquanto terminava de desinfetar o ferimento e aplicava o curativo.
— O que eu vi foi alguém que, mesmo após cair, teve a coragem de se levantar e continuar. Isso é algo para se orgulhar, Shin.
Ela terminou de tratar o meu joelho e sorriu para mim.
— Não pense que foi uma vergonha. Pelo contrário, foi uma demonstração de força. — disse ela, enquanto mostrava um grande sorriso no rosto.
Fiquei em silêncio por um momento, absorvendo suas palavras. Elas eram mais profundas do que eu esperava, e me fizeram sentir um pouco melhor sobre o que aconteceu.
— Obrigado, Aiko — disse, finalmente, levantando-me.
— De nada. E lembre-se, sempre que precisar, estou por aqui.
Nos despedimos e saí da enfermaria, ainda pensando no que ela disse. Suas palavras ecoaram na minha mente, oferecendo um consolo inesperado.
Na hora do almoço, quase todos estavam com suas famílias comendo. Eu estava sozinho porque pedi para a minha família não vir, então fui comer a marmita que a minha mãe preparou para mim. O cheiro da comida de minha mãe misturava-se com a gritaria e a agitação do festival, mas nada disso parecia me animar, mesmo com as palavras de consolo da Aiko e dos meus amigos.
Enquanto procurava um lugar para sentar, avistei Yuki à distância. Ela estava parada, olhando ao redor com uma expressão nervosa, segurando algo na mão. Não consegui ver o que era, e ela o apertava contra o peito, como se contivesse algo importante. O que poderia ser tão importante para deixá-la assim?
Quase instintivamente, dei alguns passos em sua direção, mas hesitei. A curiosidade lutava contra minha timidez. "Devo perguntar o que está acontecendo? Não, e se ela me achar intrometido?" pensei.
Ela olhou em minha direção por um breve momento, e senti um frio na barriga. Yuki parecia querer algo, mas estava tão perdida em seus pensamentos que não me viu. O mistério do objeto, que ela segurava, e seu comportamento inquieto me corroeram por dentro, enchendo minha mente de perguntas sem resposta.
"O que será que a está preocupando tanto?" pensei, sentindo a curiosidade me corroer ainda mais. Esse mistério, combinado com a tensão do festival, me acompanhou pelo resto do dia, criando uma expectativa inquieta para o que viria a seguir. Mal sabia eu que aquela pergunta me levaria a descobertas inesperadas.
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