No templo, o imperador se levantou de seu trono e atraiu a atenção de toda a corte para ele. Sua aura imponente era sentida até o último convidado da última fileira de assentos de tão grande que era. Ele passou os olhos por todo o lugar, vendo os rostos de companheiros e de nobres gananciosos, uma visão que há muito se acostumou.
"Todos aqui sabem para que é a cerimônia de hoje e o objetivo dela."
Os nobres levantaram-se e abaixaram a cabeça em respeito ao rei, atentos às próximas palavras de cumprimento antes de iniciar o evento.
"Hoje é um dia de comemoração. Um dia de honra e respeito. Um dia para recompensar aqueles que conquistaram feitos incríveis para o império. Seus feitos trouxeram benefícios a todos e trarão um futuro brilhante para nós. Glória ao império!" O imperador exclamou no final.
"Glória ao império!" E os nobres gritaram em uníssono.
Félix sorriu para a visão à sua frente. "Que comece a premiação!"
Um som soou dos músicos tocando seus instrumentos e o imperador voltou ao seu trono, com os nobres sentando-se novamente. A cerimônia estava começando e os sussurros eram inaudíveis pela música que tocava. O sol entrava pelas lindas janelas e iluminava todo o lugar, principalmente o caminho que os premiados passariam, ressaltando toda a decoração. Todo o ambiente estava incrivelmente belo e digno de uma cerimônia de prêmios.
Um homem caminhou para a frente do imperador, estando abaixo de seu trono e no fim da passarela que eles caminhariam. Ele era o cerimonialista, aquele que apresentaria os convidados. Ele era gordo e tinha um bigode bem cheio, além de cabelos lustrosos negros. Seu rosto era simpático e parecia ser gentil. O homem sorriu para todos e começou a apresentar.
"O estrategista que guiou a todos para a vitória da guerra. Aquele que com sua mente brilhante e astúcia perspicaz criou planos surpreendentes. Filho de Sua Majestade, Sua Alteza Imperial, Príncipe Aiden Valkirien Yulard!"
O anúncio reverberou em todo o recinto e com ele a porta do salão principal se abriu.
Na entrada, o segundo príncipe estava em pé, vestindo roupas luxuosas e, ao mesmo tempo, discretas, que combinavam com sua aparência elegante e refinada, tornando-o um pouco mais ensolarado e alegre do que realmente era. Claro, o sorriso em seu rosto não era inteiramente pela ocasião e nem falso, porque de relance ele via os rostos com um ódio disfarçado nos nobres idiotas das outras facções. Se ele pudesse, com certeza riria alto das expressões distorcidas.
Seus pés deram os primeiros passos e ele caminhou pelo caminho até o palco que o imperador estava, com seus irmãos e irmãs do lado dele. Por todo o caminho, sua arrogância natural estava expressa, com as costas eretas e a cabeça levantada, mostrando a todos que ele conseguiu chegar ali com sucesso, irritando alguns nobres que não podiam expressar sua frustração. O canto levantado de sua boca nunca se abaixou desde que apareceu, debochando de todos eles.
O imperador olhava para seu filho, o qual caminhava imponente, e não pôde deixar de querer dar um suspiro. Ele tinha ciência do que estava rondando na cabeça dele ao pensar em alguns nobres que vinham em sua mente, mas ele não podia fazer nada. Também não estava preocupado, por mais que seu filho seja um pouco voluntarioso e travesso, não é imprudente. Ele sentia orgulho por ele também, pois vendo ele, lembrava de si mesmo há anos atrás, no mesmo lugar que ele diante de seu pai.
Aiden chegou ao final e, em frente ao imperador, ajoelhou-se com a mão no peito, esperando pela fala do rei para premiá-lo.
Félix se levantou e caminhou até estar na ponta do palco e estendeu a mão para o cerimonialista, o qual entregou-lhe um edital real escrito os prêmios do príncipe. Os olhos castanhos desceram para a cabeleira loira de seu filho e o analisaram mais um pouco antes de abrir seu pergaminho. O ambiente todo estava em silêncio, com a atenção de todos eles nas duas figuras centrais.
"Aiden Valkirien Yulard, por suas conquistas e seus esforços na guerra contra Torzik, será dado a você cem mil ouros, o título de comandante imperial, uma medalha por sua bravura e a 'Espada da Alvorada'."
Com a fala do imperador, um crescente burburinho crescente entre os nobres surgiu. Muitos ficaram em surpresos pelo segundo príncipe ter sido recompensado com tal espada, pois essa era um tesouro da família imperial e de muito renome e famosa por todo o império, por ter sido forjada por um esplêndido ferreiro e usada pelo terceiro imperador, o qual aumentou os limites da atual Yulard.
Félix fechou o edital e olhou para seu filho, com tamanha seriedade que os sentidos de Aiden sentiam a queimação em sua cabeça.
"Além disso, eu, Félix Varkin Yulard, o imperador de Yulard, nomeio-o meu príncipe herdeiro e sucessor de Soleil."
A declaração foi feita, não apenas chocando os nobres que estavam pasmos em seus assentos, como também o príncipe que estava ajoelhado, além dos outros membros da realeza. Se a 'Espada da Alvorada' criou conversas por parte dos nobres, com alguns sendo contra, tal anúncio fez com que ela se tornasse irrelevante. A decisão do príncipe herdeiro é algo a ser levado sério que impactaria toda a corte e levaria a uma mudança de poder.
Aiden levantou a cabeça para encarar seu pai e olhou em seus olhos, confuso pelo movimento que tal imperador fez, sendo que isso não é de seu feitio, apenas para ver que ele estava resoluto e firme, tão sério que o lembrava do dia que ele decidiu se entrava em guerra contra Torzik ou não. Isso foi surpreendente para ele que, embora não fosse oficial, era um fato indiscutível que ele seria o herdeiro, mas não pensava que o anúncio seria feito neste momento. O mesmo pode dizer por parte de sua família, que, com certeza, vendo suas reações também não foi avisada.
"O príncipe Aiden é o príncipe herdeiro? Como? Não ouvi nada disso!"
"Você não me disse que o príncipe Daniel tinha chance de vencer?"
"Hahaha! Eu sempre soube que nós seríamos os ganhadores!"
Enquanto Aiden pensava nisso, os nobres criavam conversas, discussões para todos os lados. A facção do primeiro príncipe estava de cabelos em pé pelo choque do imperador ter decidido seu príncipe herdeiro sem nenhum aviso ou rumor, sequer havendo uma cerimônia de nomeação, apenas uma declaração unilateral na premiação. A facção do segundo príncipe estava em folia, regozijando-se pelo infortúnio de seus velhos inimigos da facção ao lado e por terem apoiado o príncipe certo; até o Conde Miller estava quase rindo de alegria ao lado de sua esposa. E a facção do terceiro príncipe não estava muito abalada, muitos esperavam tal resultado e até pensavam em ir para as outras, até voltarem para a facção neutra que estava indiferente.
O mais frustrado de tudo isso é Dominique Oliveira Santos, o Duque Santos, por ter ficado do lado errado. Ele não conseguia acreditar que o pirralho arrogante do segundo príncipe havia conseguido a posição que ele tanto almejava para o primeiro príncipe que ele apoiava. Nem que o imperador fez tal declaração; toda vez que ele citava ou mencionava algo do tipo para o sol do império era como se estivesse falando com a parede ou era olhado com aqueles olhos frios e avisado para não se meter nos assuntos do trono. Mesmo se não tivesse no lado do primeiro, ele não conseguia ficar do lado do segundo, por odiar aquela personalidade detestável.
E a frustração vira raiva, a qual se incendeia ainda mais ao se lembrar que desde que a guerra acabou, o Duque Noir começou a estragar seus planos e nenhuma contramedida aos avanços da outra parte foram efetivas. Essa dupla de cães malditos sempre se meteram em seu caminho. O pior é que ele não podia expressar, sequer quebrar algo, por estar na frente da multidão e ainda em um evento público. Tudo que lhe restou foi respirar com dificuldade e se acalmar, além de ter que criar paciência para lidar com os nobres de sua facção que criavam pressão sobre ele com seus olhos.
Se o príncipe Aiden soubesse a situação do Duque Santos, ele riria bem alto e soltaria um comentário sarcástico, divertindo-se em ver essa cobra velha morrer de raiva. Bem, não é como se ele não pudesse imaginar tal momento depois do evento.
A família Miller estava surpreendida com tal visão, principalmente Ivan que parecia sério por fora, mas estava rindo por dentro. Até Claire, a condessa, o observou e sabia o que se passava pela mente de seu marido, mas ela não era muito diferente, ela nunca gostou do líder da facção do primeiro príncipe e alguns outros, embora haja muitos bons nobres, a liderança era só péssima. E para Phillip, desde o que presenciou no exército, não tem boa impressão de alguns nobres, sendo um deles o Duque Santos, por isso achou bem feito, pois sabia que ele era rival da facção do segundo príncipe.
Johannes, Brandon e James não tinham uma opinião formada sobre o assunto. Johannes é uma estrangeira de uma nação derrotada, aquele que se torna o imperador e as batalhas da corte não são algo que ela leve em consideração no momento, principalmente por ser noiva do segundo filho de um conde. Brandon é um servo e não se envolve politicamente, muito embora soubesse que o segundo príncipe era o principal candidato ao trono. E James simplesmente não ligava.
No entanto, tanto Brandon quanto James tinham o pensamento de estarem presenciando a história; principalmente Brandon, por ser um servo, poder ver o imperador e o príncipe, ainda mais uma declaração de príncipe herdeiro, é algo inimaginável para alguém de sua classe.
"Brandon, isso é bom?" James sussurrou para Brandon ao inclinar-se um pouco para ele.
"Para nós sim." Brandon respondeu. "O senhor apoia o segundo príncipe, então sua nomeação como príncipe herdeiro beneficiará todos aqueles que o apoiam, inclusive o conde."
"Oh." Ele assentiu, não perguntando mais.
James ainda tinha algumas perguntas a fazer, mas sabia que não era o momento. Além de estarem na premiação, o ambiente era aberto e sempre havia aquele que escutava demais.
"Obrigado, Sua Majestade." Aiden levantou-se e curvou-se para o rei, indo para a lateral.
Ele sabia que o tempo de seu prêmio havia acabado e ainda tinha outros que ganhariam suas recompensas, bem como que não podia atrasar todo o evento pela surpresa repentina que o imperador fez.
A música soou novamente pelos músicos, uma diferente da anterior, mas ainda tão bela e melodiosa quanto a anterior. Com ela, os nobres agitados começaram a se aquietar, eles notaram que não era o momento. Muitos ainda querem falar, mas decidiram ficar quietos. O cerimonialista deu dois passos à frente de onde estava e, ainda nervoso pelo que acabou de acontecer, começou a apresentar o segundo premiado.
"O general que comandou os soldados para a guerra e que lutou bravamente na conquista da capital inimiga. O Celestia de nosso império, um homem com habilidades soberbas e uma fama de gênio espadachim. Nativo de Linden e chefe de família, o único Grão-Duque do império, Cédric Isis Noir!"
Assim como na primeira vez, a porta se abriu pela segunda, revelando um homem vestindo de preto da cabeça aos pés, parecendo mais um corvo do que homem em si, mas nada conseguia esconder aquela combinação de olhos negros e cabelos de cor azeviche, tão harmoniosos que parecia davam uma sensação etérea. Suas roupas eram todas de design simples, sem muitos enfeites, mas ainda tão de bom costume e de boa costura quanto o do segundo príncipe, ressaltando sua pele branca e figura máscula, além da impressão de ser mais alto, pois a calça em suas pernas cumpridas realizavam tal ato.
Algumas damas olharam para o homem e se encantaram, não se lembrando dos terríveis rumores que rondavam tal pessoa.
No entanto, mesmo que os nobres o encarasse e as damas não deixassem a visão de seu rosto um minuto sequer, ele os ignorou tão bem quanto fazia nas ruas da capital. Os passos não eram rápidos e nem devagar, estavam na medida certa para que demonstrasse seu temperamento frio para qualquer um que visse; ele nem estava escondendo sua aura, dando calafrios e pressionando a todos que estavam próximos dele. O queixo alto, o cabelo penteado para trás, os olhos tão frios quanto montanhas nevadas e a expressão neutra não demonstrando nada. Ele parecia um ascético de tão alienado à multidão parecia.
Contudo, no meio da multidão, sem sequer parar seu passo, ele sentiu a dor em seu ombro, o ardor surgindo, tão semelhante à primeira vez que sentiu que rapidamente associou tal acontecimento com o que passou a alguns dias na rua. Ele discretamente observou todo o lugar, vendo e analisando cada rosto que seus olhos chegavam até chegar ao que queria. Um ruivo de olhos verdes o encarava com fascínio e prestava toda sua atenção em si.
Ao tê-lo sobre os olhos e concentrar parte de sua mente nele, a marca em seu ombro ficou mais quente, como se estivesse pegando fogo sobre sua pele.
'De novo?'
Cédric não entendia o porquê de sentir isso. Parecia que seu ombro pegaria fogo a qualquer momento e somente quando aquele garoto estava próximo a si. No entanto, não tinha nada demais nele. Ele havia pedido a seu assistente para vigiá-lo e procurar suas informações, recebendo em pouco tempo um relatório completo sobre a pessoa, e a conclusão foi que era uma pessoa comum. O ruivo que fazia sua marca queimar era um empregado de um conde desde mais novo e era filho de uma antiga empregada pessoal da condessa, trabalhando até hoje e cuidando principalmente do filho mais novo, que ainda está no começo da adolescência.
Suas informações incluíam seu passado, o fato de sua mãe ter morrido de uma doença aos seus dezesseis anos, ter praticado aulas com os jovens mestres da casa em que trabalha e ser um assistente do conde durante os últimos três anos. Até mesmo tinham o fato dele ter participado da descoberta de um caso de fraude e abuso infantil do orfanato. E isso só comprova que não havia nada suspeito sobre ele, pois seu passado era limpo, mas consistente, sem um único sinal de que foi modificado.
'Ele não tem nada fora do comum e parece ser uma boa pessoa. Mas minha marca fica assim nas duas vezes que vejo ele…'
Além disso, descarta a ideia quase improvável de que ele fosse um Celestia, pois nada à sua volta dizia algo do tipo, provando o que sentia dele na primeira vez que o viu. Só que isso não explica a mudança em sua marca. E nem outras ideias que ele tinha em mente, mas, por hora, deixaria de lado.
Cédric ajoelhou-se perante ao imperador, da mesma maneira que seu amigo, o príncipe Aiden fez antes dele. As damas sentiam-se triste por não poder mais vê-los, mas aqueles servos próximos do palco faltavam tremer do frio que sentiam.
O imperador encarava o homem ajoelhado à sua frente, lembrando-se da pobre criança que ele era quando mais jovem. Não havia muito o que fazer na época dos acontecimentos infelizes na vida dele. Ele era o imperador, mas não podia meter-se na vida familiar da alta nobreza. Um misto de culpa e arrependimento apareciam sobre os olhos castanhos e o que ele podia fazer agora é se conformar com tais sentimentos. E agora aquela criança que existia no passado havia crescido para um adulto taciturno que vive para seus deveres. O pior é que ele entendia o porquê de viver assim, mas queria aconselhá-lo a não ser isso.
Ele quase deu um novo suspiro, mas se controlou, abrindo o edital.
"Cédric Isis Noir, por sua ótima liderança do exército imperial, por proezas em frente ao exército inimigo e, principalmente, em sua luta contra os Celestias da outra parte, irei lhe recompensar com cem mil ouros, isenção de impostos por três anos e redução para o povo de seu território, além de conceder-lhe um desejo que seja dentro do possível da minha parte como imperador."
Félix fechou o edital e o público ficou ainda mais atento, esperando o próximo segundo para ver se havia mais um anúncio surpresa como da última vez, mas não houve mais nada.
"Obrigado, Sua Majestade, o imperador." Cédric disse, levantando-se e curvando-se, indo direto para a lateral.
"Isso quer dizer que o Grão-Duque não irá se casar com a princesa?"
"Não há rumores que seria para o mercenário?"
"Eu ouvi que o imperador fez a oferta, mas o mesmo recusou impiedosamente."
"Coitada da princesa, teve o coração partido por tal homem."
"Por isso que eu digo que ele não é uma coisa boa."
Isso foi completamente inesperado por muitos. Os nobres tinham certeza que o imperador proporia ao Grão-Duque a mão de sua primeira filha em casamento a ele como prêmio de suas conquistas na guerra, mas não houve isso. Pelo menos para apaziguar aqueles que tinham um pensamento de superioridade contra os plebeus, antes de ser feito para o novo Celestia do império, mas somente rumores foram feitos, sem nenhuma fonte confiável. Claro que todos eles tinham certeza que o Grão-Duque recusaria, mesmo que a oferta fosse feita. O mesmo não parece ser do tipo que se casaria em primeiro lugar.
Brandon olhou de longe para o homem que esbarrou na rua dias atrás, vestindo as mesmas cores como na primeira vez que o viu, mas incrivelmente mais bonito que naquela época. Ele parecia diferente pelo visual, mas ainda tinha toda a expressão indiferente que viu antes. Não tinha como não dizer que ele não era belo, para seu padrão, o homem era mais que perfeito dentre todos os que estavam neste recinto.
Para Brandon, os rumores de Cédric, o Duque das Sombras, eram apenas rumores e, mesmo que fosse verdadeiro, havia exageros e mentiras em meio à verdade para que não sejam tão confiáveis quanto realmente são. Tais rumores também não diziam nada sobre a personalidade da pessoa, ele é alguém que acredita no 'ver para crer' e teria que presenciar todas as coisas ruins, ou ao menos ver o Grão-Duque realizar alguma para que possa mudar sua opinião.
De qualquer forma, ele não tinha contato com o homem, mas isso não o impedia de sentir-se simpático com a luta do outro.
"Uh? Ele me é familiar…" James sussurrou, estreitando os olhos um pouco enquanto olhava para o homem na lateral, o qual acabou de agradecer o rei.
Brandon encarou o garoto. "Ele é o cara com quem esbarrei em nosso tour."
"Ah!" James exclamou baixo. "Ele é o cara que me deixou todo arrepiado. E pensar que ele era o Grão-Duque Noir e um Celestia…"
'Não é de se admirar que senti frio.' James pensou.
Os poderes de escuridão do Grão-Duque Noir são conhecidos por todo o império e, assim como os elementos naturais em Celestias, eles passam uma atmosfera, uma sensação, para quem o sente de acordo com a energia que emana. E a energia da escuridão é fria, o bastante para que em pleno sol eles sentissem frio. Além da pressão silenciosamente imposta tanto pelo nobre quanto naturalmente.
James olhou para Brandon, lembrando que ele havia esbarrado com o homem infame. Um medo se instalou em seu peito, por causa das histórias que o rondam. Ele não queria perder seu amado irmão.
'Nós tivemos sorte de ele não ter se importado.'
"Também estou surpreso." Brandon comentou, dizendo a verdade. Ele estava impressionado.
Descartando o fato de que um homem tão bonito quanto o Grão-Duque não se vê todo o dia, ele ainda é um nobre único em todo o império e um abençoado pelos Deuses. Seja um homem de seu status, trabalho ou beleza, não é possível imaginar que se encontraria com ele na rua em apenas um esbarrão enquanto estava passeando pela capital. Isso pode ser dito como sorte ou azar, dependendo de se desenvolvesse.
Ele só tem a dizer que teve sorte em ver pelo menos uma de perto. Os humanos eram criaturas que perseguem a beleza, afinal, é impossível não ter sido atraído pela admiração ao vislumbrar tal visão que entra de acordo com sua estética.
'Embora eu ainda goste do bastardo do Phillip, devo dizer que aquele rosto fez meu coração parar uma batida.'
Era uma verdade que ele admitia com um pouco de pesar, porque mesmo que negasse, não deixaria de ser verdade.
Os músicos começaram a tocar novamente, dando início ao terceiro principal premiado que entraria pelas portas do salão principal. Os nobres rapidamente ficaram quietos, mas era possível ver um ou outro fofocando baixo em conversas enquanto esperavam o terceiro convidado.
"Um mercenário que estava sob o comando de um nobre de nosso império e que graças a ele conseguimos com sucesso deter um dos pilares de Torzik. Um Celestia do atributo de vento que dizem ter feito furacões com suas mãos. Ele é de origem plebeia e possui um grande poder, a nova estrela recém descoberta, Kai Samir!" O cerimonialista gritou alto no final da apresentação.
Novamente, um homem foi revelado quando as portas se abriram e, como nas outras vezes, houve suspiros de damas e a atenção dos nobres, porém, diferente dos outros, esse foi acompanhado de muito mais intensidade, por ser de alguém que nunca tinham ouvido falar. O mercenário Kai Samir, o recém descoberto Celestia, é uma pessoa misteriosa que quase todos ali querem saber como é, por isso os olhos de muitos nobres eram recheados de ganância para ele e vontade de atraí-lo para seu lado. Se a facção ou o nobre que puder fazer amizade com tal Celestia, seu poder e influência no império aumentaria em outro nível apenas por tê-lo como aliado.
Claro, o homem não se importava com nada disso.
Seus cabelos ruivos, em tons mais escuros que os de Brandon, brilhavam em meio ao que entrava pelas janelas e o tornavam mais brilhante. Sua pele dourada perfeita ganhava um realce em plena iluminação e seus olhos vermelhos pareciam pedras preciosas para quem os visse, tamanha era a luz que podia se ver nelas. Acompanhados de todas essas características estavam um sorriso rebelde, que não escondia a arrogância e grosseria de um mercenário, e um rosto do mesmo tipo que seu sorriso — revoltoso, insubordinado, rude e desobediente, cheio de juventude e vitalidade, com traços masculinos, mas também delicados.
De qualquer forma, ele era bonito, semelhante à Ferion. Talvez a regra para os Celestias era ter aparência bonita para atrair a atenção dos Deuses, no fim das contas.
O mercenário parecia mais jovem do que realmente era, com seus vinte seis anos, ele com certeza viveu muitas coisas e vivenciou muitos conflitos, então, com certeza estava ciente de todos os tipos de olhares que caíam sobre ele. Toda essa atenção para ele não era nada comparado à pressão da intenção de matar de outro Celestia ou a situação de vida ou morte que sentiu centenas de vezes no campo de batalha. Mas não o impedia de enojar alguns olhares gananciosos que pareciam em seu corpo e de não gostar de tudo isso.
Ele só estava participando de tal cerimônia, porque como um cidadão do império, ele tem completa e total ciência do que era a Celebração da Vitória e do que é possível ganhar caso participe. É um lugar que lhe trará honra e prestígio, mas não é algo que queira. Seu principal desejo é o prêmio em ouro que ganhará.
Kai tinha um lema: dinheiro é sinônimo de felicidade, mas não é ela. Seu significado será levado por toda a vida.
Por ser de origem pobre, plebeu e órfão, o dinheiro é visto como algo muito valioso que pode permitir conforto e liberdade. O orfanato que ele viveu toda sua vida até se tornar mercenário estava em uma vila rural próxima do oceano e vivia do comércio e do turismo, no entanto, isso não impedia o orfanato passar dificuldades devido às baixas doações e o orçamento feito pelo prefeito, então desde jovens as crianças que viviam ali tiveram que trabalhar, e ele não era diferente.
O Celestia mercenário tornou-se mercenário durante sua adolescência, assim que atingiu a idade mínima permitida pelo império, que é catorze anos. E desde então, pelo menos parte dos lucros são enviados para o orfanato em que viveu, como forma de recompensar por cuidarem dele e também para aliviar o fardo da diretora que cuidava das crianças com muito amor e carinho.
Assim, tal lema, frente às dificuldades que viveu, era algo óbvio. O dinheiro para si era algo bom e poderia facilitar muito sua vida e daqueles com quem se importa. No entanto, ele ainda preza seus relacionamentos e as pessoas, mas não deixa de gostar do capital.
A atenção de Kai focou-se no homem parado em pé no final do caminho que estava percorrendo no tapete vermelho no centro do salão. Ele era mais alto que ele, mais musculoso que ele e mais feroz que ele. Só de relance ele sabia que o homem ali era o imperador, sequer precisava estar com a coroa dourada em sua cabeça ou estar no lugar que o chefe do império deveria estar, apenas a presença dele era o suficiente para denunciar quem ele era.
Ele tinha que admitir, o homem era seu eu ideal. Ele não gostava muito do seu rosto que ainda possuía aparência jovem e pouquíssimo delicado, já que era um mercenário. Pelo menos ele passava uma aura rebelde que era expressa em sua face e tinha traços mais masculinos e marcantes, apenas poucas áreas o deixam insatisfeito.
Ele ajoelhou-se em frente ao imperador da mesma maneira que os outros dois que vieram antes. Seu olhar estava para o chão, ignorando todos que estavam sobre si, mas tentando o mais forte de todos, o do homem com a coroa à sua frente.
"Kai Samir, seus esforços na guerra contra Torzik foram muito comentados por todos os soldados e a história se espalhou pelo império. Sua luta contra um dos quatro Celestias, Hazel Ilas, foi essencial para a conquista da capital, Glarus. Por isso, como prêmio por suas contribuições, lhe darei cem mil ouros, uma propriedade em nome da família imperial na capital e um título de cavaleiro."
O imperador falou e todos ansiavam por mais palavras. O público não tinha certeza se teria mais, pois na premiação do Grão-Duque não houve, mas a expectativa não deixava de subir.
E o imperador não os decepcionou.
"Além disso, se concordar, proponho um casamento entre minha primeira filha, a Princesa Elise, como forma de conexões entre nós."
O mercenário nada disse. Ele ficou em silêncio remoendo as palavras após o término delas e não pôde deixar de xingar em sua mente mil vezes. O outro poderia ser um imperador, um governante de um país, mas isso não mudava a forma como ele estava vendo a situação que estava sendo empurrado.
'Filho da puta, você está me fazendo aceitar a proposta com a pressão do público, não é? Desgraçado.'
Kai também tinha ouvido os rumores e como não podia entender o que o imperador queria fazer? Mesmo que não fosse sua intenção, um homem que está no poder há anos deveria saber as consequências e o cenário de fazer uma proposta assim. Ele queria fazê-lo aceitar a proposta de noivado com a família imperial usando o público como pressão e para ver se ele iria o envergonhar, para que não tivesse escolha a não ser negar.
Ele não poderia dizer que não entendia, o fato de que um Celestia recém descoberto e que não se sabe muito sobre ele apareceu em seu país, é óbvio que deve ser cauteloso. Mas o outro ousou fazer isso a ele, sendo imoral, ele estava com um pouco de raiva.
Claro, a realidade não é como Kai pensa. A oferta de casamento entre a família imperial e um Celestia na premiação era algo com precedente e, até pode-se dizer, comum, sendo as mãos tanto de príncipes quanto as de princesas ofertadas, mas não era um fato tão conhecido. Isso tinha o propósito não de forçá-los, mas de mostrar o reconhecimento por suas ações.
E o imperador não era tão mesquinho a ponto de fazer isso, pois, se ele quisesse, bastava usar outros métodos que seriam bem mais eficazes em forçar alguém a querer ficar noivo de sua filha.
"Desculpe, Sua Majestade. Mas eu recuso." Ele disse, em uma voz clara.
Em vez das conversas estourarem entre o público, ninguém ousou falar nada. Era a primeira vez que viam alguém que recusaria uma proposta dessas, de se ter uma conexão direta com a família imperial. Quantos nobres morreriam por ter a chance de se tornarem candidatos a ganhar a proposta, e ainda mais por serem eles, mas o homem a quem recebe recusa sem nem hesitar. Isso obviamente chocou a todos e ninguém saberia a reação do imperador.
A princesa Elise, aquela que tem sua mão proposta, estava surpresa também pelo fato do mercenário ter se recusado a se casar com ela. Ainda que o cenário da recusa fosse bom para ela, não deixava-a menos surpresa, e perguntava-se porque ninguém se casaria com ela. Não que tivesse expectativa quanto a Cédric, sempre soube que ele não a amaria, mas não podia deixar de sonhar. Ele era seu amor de infância e seu primeiro amor, aquele por quem se apaixonou à primeira vista assim que o conheceu em uma visita ao palácio. E devido ao fato de terem se conhecido há tanto tempo, ela tinha uma ideia clara de como era a personalidade dele, por isso não tinha esperanças.
Além disso, ela era da família imperial, a realeza, uma princesa, seu status não permite que ela se apaixone e se case com qualquer um que ela goste. Se ele for um nobre de alto escalão ou for vantajoso para o império em forma de aliança, ela deve fazer o seu sacrifício. Isso é o que o futuro reserva como não-herdeira do trono, assim como seus dois irmãos e irmãs.
Amor nunca foi uma opção no casamento real. Seus pais são um exemplo disso, embora tenham sido os mais responsáveis e respeitosos um com o outro. Por isso, estava preparada quando os rumores apareceram e seu pai pediu sua opinião na proposta de casamento.
Agora, até um mercenário recusa-se a casar com ela, embora seu status seja muito mais alto que o dele, não podia deixar de criar uma dúvida se o problema era ela, como não era atraente o suficiente?
"Tudo bem." O imperador disse, tão calmo, como se a recusa não afetasse seu orgulho. E realmente, não afetou.
"Obrigado, Sua Majestade." Kai falou, indo para junto dos outros dois Celestias.
Então, as conversas apareceram, com muitos questionando a recusa de uma proposta que é tão boa.
"Ele é louco? Por que recusar algo tão bom? É um noivado com a princesa Elise!"
"Ter uma conexão direta com a família imperial é algo que todo o nobre quer."
"Um Celestia é realmente um sortudo. As melhores coisas vão para eles. E ele ainda recusa."
Os nobres definitivamente não entendiam o porquê disso e criavam mil e uma teorias sobre o motivo da recusa.
As damas que ouviram ficaram animadas por vê-lo recusar a proposta, dando esperanças para que elas possam ter uma chance, já que nenhuma delas tinha ousadia para chegarem perto do príncipe Aiden ou, principalmente, do Grão-Duque Noir, por terem um status muito maior que o delas e não serem fáceis de abordar. Um mercenário Celestia é bem mais fácil, muito embora ainda seja um abençoado pelos deuses e uma força a ser reconhecida por todo o império, é algo que vale a pena tentar.
Então, não foram só algumas que arrumaram seu cabelo, endireitaram seu vestido e olharam para Kai tentando chamar sua atenção, inutilmente. A determinação delas era grande e muitas iam abordá-lo depois da premiação.
A vez de Ferion demorou um tempo, com muitos outros generais e comandantes que apareceram depois da premiação de Kai e aumentaram os números de pessoas que tinham que ser premiadas. Não tinha mais o entusiasmo do início da premiação depois de ver as três principais figuras do evento, por isso, diminuiu muito o burburinho da parte dos nobres, com muitos com expressões neutras e calmas, mas seus familiares, principalmente algumas crianças, tinham cara de tédio ao ver tal cena se repetindo diversas vezes. Eles se sentem entediados de ver isso e ficar sentados por um longo tempo.
Ferion recebeu do imperador um prêmio de cinco mil ouros e uma medalha de honra de nível dois, trazendo prestígio para a casa Miller.
O Conde Miller não podia estar mais orgulhoso desse seu filho e herdeiro, sabendo que tinha feito uma boa escolha ao deixar o título e a propriedade para ele. O garoto que agia todo sério quando criança se tornou um homem responsável e forte, fazendo-o sentir, em muito tempo, a passagem do tempo ao notar que ele realmente o viu nascer e agora estava com vinte quatro anos. Um suspiro saiu de seus lábios com um sorriso contido, com um leve curvar de seus olhos, transbordando orgulho e carinho ao ver seu filho ajoelhado perante ao imperador. Ele estava ficando velho, mas se sentia um pouco em paz.
Ele olhou para o lado e viu seu segundo filho, Phillip, estando agora com mais de vinte anos e é o que mais estava lhe preocupando agora, mas também ficava contente com sua educação. Ele é um bom cavaleiro e só possui elogios de seus superiores, por isso apreciou-o. E o último é James, com apenas doze anos é o caçula, mas também sua esperteza o faz não se preocupar muito, ele sabe que o garoto vai crescer e se tornar um grande mago, mas queria que demorasse um pouco mais para isso.
Seus filhos estão crescendo e ele está criando cabelos brancos. Isso o faz sentir-se um pouco triste.
Uma mão passa para sua orelha, acariciando-a, e atraindo sua atenção para a dona dela. Sua esposa, Claire Miller, sua parceira e companheira em todos esses anos, estava o olhando com olhos carinhosos e sorriso grande, conhecedor, como se entendesse o que ele estava sentindo. Ela o conhece tão bem e também é mãe de seus meninos. Ele não duvidaria se ela soubesse exatamente o que estava pensando, pois ela sempre adivinhava com sucesso, nem que estivesse da mesma maneira. A orelha pega foi apertada levemente e o acalmou, abrindo um sorriso também em seu rosto adulto, arrancando um leve riso também, mesmo que não seja muito comum.
Ele ficou calmo, pois sabia que mesmo que envelhecesse, sua esposa estava ali para ele e eles para seus filhos.
O conde pegou as mãos de sua esposa, tão brancas e bem cuidadas como se fossem iguais às de vinte anos atrás e levou cada uma até seus lábios, beijando-as com carinho e suavemente. Seus olhos transbordavam de amor enquanto viam a cabeleira roxa tão familiar para si e o rosto gentil que vê todas as manhãs. Ele nunca amou e nunca amará como ama ela.
A condessa, em troca de ação, corou um pouco, como uma moça. Nunca estava acostumada com tais atos de seu marido, principalmente em público — não que fossem raros, mas ainda a deixava envergonhada.
Johannes vendo o amor de contos de fadas do conde e da condessa não pôde deixar de sentir um pouco de inveja, sabendo que o que eles tinham não era apenas algo lindo, mas também raro, não importa de onde e quando viesse. Ao longo de sua carreira de atriz, quando ainda trabalhava em um teatro, ela tinha visto muitos nobres que publicamente diziam amar suas esposas e ter o amor do século, mas nos bastidores engraçaram-se com mulheres e homens; um ambiente assim faz criar uma habilidade de distinguir a verdade da mentira, foi por isso que ela via que o que o casal tinha era verdadeiro e profundo.
Ela olhou para Phillip que estava ao seu lado e olhando para seu irmão ajoelhado com uma expressão ilegível, pensando em como tal filho veio de um casal que possui corações flutuando no ar à sua volta. Obviamente, ele diz amar Brandon, só que para ela não parece. Todo o teatro que ele quis fazer e ela concordou era apenas um meio de mascarar seu medo, mas isso, ela não tem direito de se intrometer.
James olhou para seus pais assim que tirou os olhos de seu irmão mais velho, mas ficou com uma expressão indescritível no rosto. Que criança gostaria de ver seus pais demonstrando afeto em público? Embora James goste deles e do quanto se amam, não significa que ele goste de ver.
E Brandon, sorrindo vendo aquilo, pensando mais uma vez que gostaria de viver um amor como o deles.