Dez minutos após o fim da batalha, Kael ainda estava congelado no mesmo lugar. Sua mente, em branco; seus olhos, desfocados. A cena que presenciara havia o deixado em estado de choque. Mas, aos poucos, seus batimentos começaram a se acalmar, e o aperto em sua adaga relaxou.
Um cheiro metálico invadiu suas narinas, enquanto o vermelho carmesim pintava o asfalto quebrado da avenida. No chão, marcas de sangue formavam um rastro que levava ao prédio onde ele se escondia. A visão daquelas manchas trouxe-o de volta à realidade: o monstro havia sumido, levando consigo os corpos dos soldados abatidos.
Seus pensamentos, ainda lentos, começaram a juntar as peças do que acabara de perceber. O gigante que massacrara os combatentes agora estava escondido... em seu prédio.
O instinto gritava para que ele fugisse dali o mais rápido possível, mas suas opções eram escassas. Saltar do prédio em ruínas estava fora de questão, três andares poderiam parecer pouco, mas a queda poderia causar uma contusão ou até quebrar uma de suas pernas. Além disso, o som poderia atrair o monstro. Ele estava encurralado; outras construções ao redor eram altas demais para serem escaladas, e nenhuma oferecia uma rota segura.
O tempo passava. O sol já quase atingia seu ápice no céu sobre Helium, e Kael se perdia em pensamentos, buscando desesperadamente uma saída para aquela situação.
Então, uma ideia ousada surgiu. Ao se lembrar do final da luta, percebeu que o monstro parecia esgotado e muito ferido após os tiros de rifle de precisão, e logo depois ele se arrastara para se esconder, levando os corpos consigo.
'Se o gigante estiver descansando... talvez eu consiga passar despercebido!'
'Não, isso seria um suicídio. Eu serei a sobremesa dele.'
Kael discutia consigo mesmo em pensamento, o medo e a esperança em conflito.
'Mas... e se...'
Ele começou a se mover lentamente em direção à escada de aço que levava ao terceiro andar. Seus passos eram leves, a respiração, controlada. Guardando a velha adaga na cintura, concentrou todos os sentidos na abertura à sua frente. Seus ouvidos, atentos, não captaram nenhum som vindo do andar abaixo.
Reunindo coragem e sufocando a angústia em seu peito, Kael deu o primeiro passo para baixo. O coração queria disparar, mas ele respirou fundo, forçando-o a manter o ritmo. Já no meio da descida, conseguiu distinguir pela claridade que entrava pelos raios de sol — filtrados pelas frestas da janela reforçada com tábuas — que a criatura não estava naquela sala.
Por um breve instante, sua mente relaxou, e uma sensação de formigamento percorreu seu corpo.
Crack... Crack...
Um som baixo de algo se partindo ecoou pelo edifício.
'Merda!' Kael congelou. Sentiu um suor frio escorrer pela coluna. Mas logo se acalmou.
'Não é deste andar', percebeu, ao identificar que o som vinha do andar de baixo. Parecia que o gigante assassino estava ocupado com algo.
'Preciso ser rápido'. Voltando a se mover, ele avançou com passos lentos e controlados, atento para não pisar em nenhum detrito.
A sala de 75 metros quadrados parecia se estender por um quilômetro. Cada segundo que passava aumentava o peso do suor em sua testa, e após quase quinze minutos de travessia cautelosa, finalmente chegou próximo à escada para o segundo andar.
No meio do caminho, cogitou pular pela janela para escapar mais rápido, mas as divisórias de madeira, pregadas nas janelas, bloqueavam a única rota possível, deixando-o preso a esse percurso tortuoso.
Ao longo do percurso, o som de algo sendo quebrado nunca cessou, apenas se intensificava conforme ele se aproximava das escadas.
Quando finalmente chegou ao topo, observou as escadas abaixo: a escuridão parecia engolir a sala, e um medo primitivo tomou conta de sua mente, como se um predador se escondesse nas trevas, à espreita, pronto para atacá-lo.
Vencendo a angústia crescente que o dominava, deu o primeiro passo para baixo. 'Não me veja, não me veja', repetia ele mentalmente, como um mantra protetor. Degrau após degrau, a escuridão o engolia, como uma fera faminta.
Crack... Crack...
O som continuava, desta vez mais alto, reverberando pela sala vazia e destruída.
'Deus!' exclamou Kael em pensamento, quando seus olhos finalmente se ajustaram à baixa luminosidade da sala.
Abaixado em um canto, o amontoado de músculos expostos arrancava pedaços do corpo do soldado que tivera o abdômen dilacerado durante o primeiro ataque. Dentes pontiagudos laceravam a carne do homem morto. A refeição não parecia durar muito, já que a criatura havia devorado quase toda a parte inferior. Ao lado, o cadáver do outro soldado aguardava o mesmo destino.
Parecia que o gigante não o tinha notado ou não se importava com sua presença, pois seus dentes continuavam a rasgar a carne.
'Preciso sair daqui rápido ou o próximo será eu', pensava Kael, enquanto suas mãos tremiam e o suor se acumulava em sua testa.
Abaixando-se lentamente, ele deu passos para trás, em direção à escada que levava ao primeiro andar, sem nunca tirar os olhos do monstro.
A cada metro percorrido, seu coração batia mais rápido. 'Um passo de cada vez...' repetia em pensamento, tentando se acalmar.
Crack... crack...
Thud! Um som diferente reverberou pela sala...
"Porra!" exclamou Kael, enquanto o monstro, que havia lançado a cabeça do soldado no chão à sua frente, o observava atentamente.
'Corra!' Este foi o único pensamento que surgiu em sua mente enquanto o gigante se preparava para saltar em sua direção.
Virando-se de frente para a escada, que estava a dez metros, ele correu. Atrás dele, saltou o musculoso humanoide como uma fera. Apesar dos ferimentos ainda abertos, parecia ter recuperado parte de sua força com a refeição.
Booom! O estrondo ecoou pela sala.
Olhando rapidamente enquanto se aproximava da escada, Kael viu a criatura colidir com a coluna que dividia as antigas cabines da sala. O ferimento em sua cabeça parecia cobrar o preço, pois parte de seu cérebro vazava pela abertura, afetando sua locomoção.
Sem perder mais tempo observando o monstro, Kael saltou do topo da escadaria e, com um pouso brusco, chegou ao primeiro andar destruído da loja, correndo rapidamente para a avenida deserta enquanto era perseguido. 'Merda, merda, merda...', praguejava ele, tentando aumentar a distância.
Boom!
O gigante saltou novamente, deixando rachaduras no chão com o impulso.
Como um tigre perseguindo sua presa, a montanha de músculos expostos formou um arco com os braços enquanto mergulhava, as longas garras cortando o ar como projéteis.
Woosh! Woosh!
Kael sentiu a nuca esfriar. Em um ato instintivo, ele saltou para frente, tentando seguir o fluxo do monstro.
Sua ação rápida o fez desviar do ímpeto das garras que vinham pela esquerda, mas ele não conseguiu escapar do corte pela direita. As grandes garras atingiram suas costas, rasgando sua mochila, e acertando parte de seu flanco direito.
Encolhido enquanto rolava lateralmente após ser atingido, Kael usou os braços para proteger a cabeça dos impactos causados pela força do golpe. Parou alguns metros adiante, ainda zonzo, e ouviu outro estrondo.
Boom!
A criatura não conseguiu parar o avanço e se chocou contra a carroceria de um carro destruído, onde plantas cresciam em meio aos destroços.
O impacto pareceu atingir a parte destruída da cabeça do monstro; a criatura cambaleava, tentando se colocar de pé.
Urgh!
Kael gemeu. Parecia que suas costelas estavam quebradas; sua cabeça girava e suas costas doíam. Voltando a si ao ouvir o monstro tentando se levantar, ele olhou ao redor e viu seu arco destruído e a mochila rasgada.
Lutando contra a dor, ele se ergueu e começou a tatear a cintura em busca de sua adaga, enquanto a criatura lentamente recobrava a consciência.
Logo seu semblante mudou: a adaga que antes descansava em sua cintura agora estava aos pés do monstro. Com sua última esperança de luta destruída, ele novamente correu, tentando escapar. Mas sua fuga foi breve.
Roaah!
O gigante rugiu, saltando mais uma vez em sua direção. Desta vez, o impulso era menor, como se ainda não tivesse se recuperado do impacto anterior.
Crack!
O som das costelas de Kael se partindo ecoou quando o monstro o atingiu por trás, enrolando os braços ao redor de seu torso enquanto rolavam no chão.
Parando alguns metros à frente, com o monstro enrolado em seu torso, Kael tentava se desvencilhar do abraço mortal. Estava cara a cara com a face horripilante, cujos dentes pontiagudos ainda estavam sujos com pedaços de carne humana. Sua mente entrou em frenesi quando a boca se abriu, pronta para arrancar parte de seu pescoço.
Tateando ao redor com o braço direito, Kael sentiu um pote de vidro em suas mãos. Sem pensar duas vezes, acertou a cabeça monstruosa com um arco. Esse ato tolo apenas reforçava sua vontade de viver; um simples pote de vidro não conseguiria parar o ímpeto do gigante.
Crash! O pote se quebrou com o impacto...