LETTIE
Nunca imaginei que, num período de menos de 24 horas, eu perderia minha casa, seria raptada, descobriria que tinha dois irmãos mais velhos e que faço parte de uma raça alienígena quase extinta, seria raptada DE NOVO, e formaria uma aliança entre um alienígena verde e uma criança de quatro anos para podermos salvar a humanidade de sua destruição total.
É, é isso mesmo o que você leu.
Aquele, de fato, não era o meu dia. Ou era, porque foi nele que minha vida mudou para sempre.
Eu estava de boa, de boíssima!, lutando num torneio clandestino numa tarde que já nem me lembro mais que dia da semana era.
O que foi? Não tem nada de mais lutar em torneios clandestinos.
Tá. Admito que alguma coisa deve ter de errado, para ter a palavra "clandestino" no meio. Mas, o que eu podia fazer? Aquilo era o meu ganha-pão, a única coisa que eu sabia fazer bem desde que me conhecia por gente. Além de que eles deixavam eu morar num dos quartos daquela espelunca, pagando metade do preço de aluguel que um bairro meia-boca da cidade me cobraria.
Eu estava de pé no ringue daquele galpão mal iluminado, rodeada por uma cerca treliçada que impedia os competidores de caírem na multidão ensandecida pelo calor da luta.
À minha frente, um homem gigantesco me olhava com um olhar sádico e sombrio. Seu corpo peludo tinha o formato de uma bola, usando cintos de couro negro em volta dos pulsos e pescoço, apenas coberto por uma tanguinha preta.
Que nojo.
— Lettie! Lettie! Lettie! — A multidão nas arquibancadas ao redor gritava o meu nome, tentando me animar após eu ser esmurrada na bochecha pelo meu adversário. Era nítido que haviam apostado em mim, e não foi brincadeira chegar na final daquele torneio. Meu corpo estava dolorido do tanto que eu já havia lutado.
Só mais uma luta, e eu teria como comprar a despesa até a próxima quinzena. Quem sabe, até não conseguiria comprar uma faixa nova para o meu kimono, que já havia visto dias melhores. Ah, se bem que seria melhor guardar uma parte para eu conseguir comprar minha casinha um dia. Mas, também tem aquele livro de receitas que estou namorando faz um tempo na livraria... Puxa, era difícil ter de escolher o que fazer com tão pouco.
Porém, mesmo assim…
Por que uma angústia crescia em meu âmago? Por que, por mais que as pessoas exaltassem o meu nome, suas vozes não faziam efeito em mim?
Olhei para o meu adversário do outro lado, esperando eu desferir o próximo golpe, e fiz a pergunta que me rodeava há anos:
O que eu estava fazendo ali?
Qual era o objetivo daquilo tudo?
Por quem eu estava lutando?
Eu sinto a adrenalina do combate correndo por cada gota do meu sangue; sinto um vigor que não sei se vem de mim ou da euforia das lutas; sinto que tem algo dentro de mim que ruge, mas que não consegue encontrar a voz para tal.
Ao mesmo tempo, amo e odeio isso.
Ao mesmo tempo, não sinto nada e sinto tudo.
Não sei se tenho técnica, mas me falta força; ou se tenho força e me falta técnica.
Eu precisava de um professor, um tutor, sei lá! — alguém que me ensinasse e me orientasse a lutar direito. Se não pelo prazer da luta, então para eu conseguir vencer mais torneios, ganhar mais dinheiro e tentar ter uma qualidade de vida melhor.
Mas, quem ensinaria uma mulher que mal tem condições financeiras para sobreviver até o final do mês? Quem me ensinaria de graça?
— EI, LETTIE! VAI FICAR DIVAGANDO AÍ ATÉ QUE HORAS?! EU APOSTEI EM VOCÊ! ACABE LOGO COM ELE!
Olhei para o lado e vi meu locatário sacudindo os punhos para mim, lotados com notas de dinheiro que ele arrecadou das apostas, semi-oculto pela fumaça de um charuto barato que ele fumava.
Pisquei várias vezes e percebi que meu adversário agora me olhava com tédio, beirando ao desdém, no aguardo de algum movimento meu. Bufei, sacudindo a cabeça e relaxando meus membros ao assumir uma posição de combate, e logo senti a familiar pontada de dor no final da minha coluna vertebral.
— Tá legal… — sussurrei para mim, ignorando a dor. — Vamos acabar com iss-
BUM!!!!!!!!!!!!!!!!!!! — Uma parte do galpão explodiu.
Quando dei por mim, eu já estava caída no chão, ensanguentada pelos estilhaços que me atingiram. Um zumbido apitava em meus ouvidos, quase tão alto quanto os gritos das pessoas que tentavam desesperadamente fugir dali.
De relance, vi meu adversário também caído do outro lado do ringue. Ele não se mexia, e tinha o olhar vidrado num ponto fixo.
Morto.
Um calafrio percorreu minha espinha. Pelos gritos das outras pessoas, meu adversário não devia ter sido o único que morreu com a explosão repentina.
O que estava acontecendo? O que causou aquilo?!
Minha resposta veio na forma de um homem que pousou bem à minha frente. Bom, ele parecia um homem; um homem muito estranho. Pelo pouco que consegui enxergar, ele estava quase tão semi-nu quanto o meu adversário abatido, usava uma armadura com ombreiras pontudas e tinha um cabelo preto tão comprido e espetado, que mais parecia um porco-espinho.
Ele se agachou na minha frente com os braços apoiados nas coxas robustas.
— Achei você, irmãzinha. — Ele esboçou um sorriso sardônico por trás de um monóculo quadrado com visor esverdeado. — Venha, vamos ter uma reunião em família.
No segundo seguinte, fui golpeada na cabeça e apaguei.
***
Quando acordei, soltei um berro.
Eu não estava no chão, no ringue do lugar que eu chamava de casa.
Eu estava voando.
Não por mim mesma, é claro, mas jogada por sobre as costas daquele homem que me raptou, com minha cara enfiada em seus cabelos espinhosos.
— Cale a boca, Lettie! — vociferou ele, aumentando a voz para sobressair ao meu grito de pânico. — Não me faça ter que nocauteá-la de novo!
Percorri meu olhar ao redor, vislumbrando uma paisagem desértica repleta de rochas de tudo quanto era formato e tamanho, até onde se podia ver. Eu não fazia ideia de onde estava.
No entanto, o único pensamento que me ocorria era como aquele homem estava fazendo aquilo; COMO ELE ESTAVA VOANDO?! Sem nenhum aparato, proteção, nada! Parecia um desses heróis de revista em quadrinhos, voando como se fosse a coisa mais natural e normal do mundo.
Eu tremia dos pés à cabeça. Devíamos estar na altura dos aviões.
— M-M-ME PÕE N–N-NO CHÃO!!!!!! — Me virei para olhá-lo, me permitindo agarrar seus cabelos para me segurar. — AG-G-G-ORA!!!!!!!
— É o que todas dizem. — Ouvi ele rir. — Acalme-se, irmãzinha. Estamos quase chegando. Ai! — Ele exclamou após eu puxar seus cabelos de novo quando pensei que iria cair. — Você é mesmo filha de nossa mãe, hein? Muito prazer, sou Raditz.
Não senti nenhum prazer em reciprocidade naquele momento, sobretudo após algumas palavras de sua fala chegarem até mim com um grande ponto de interrogação: irmãzinha? Nossa mãe?
Olha, eu já havia conhecido gente estranha o suficiente em minha vida, mas esse homem, este tal de… Raditz… ultrapassou todos os limites de esquisitice que alguém poderia ter.
Ao tentar compreender o que ele disse, sem querer, acabei tocando em algo macio ao redor de sua cintura, e minha tremedeira deu lugar a uma paralisia horripilante quando vi que aquilo era uma cauda, comprida e de pelagem marrom.
A pontada de dor no final da minha coluna me atingiu outra vez, mas o que me deixou mais assustada foi a sensação de sentir uma poderosa força emanando daquele homem.
Quem era ele? Ou melhor, o quê era ele?
Não sei se foi o susto da explosão lá no ringue ou o desespero de estar voando nas costas de um desconhecido a centenas de metros do chão, mas não consegui dizer ou gritar mais nada. Minha voz desapareceu. Na verdade, comecei a sentir um profundo mal-estar. Meus ouvidos eram esmagados por uma forte pressão e tive uma súbita falta de ar, o que só fez meu coração acelerar mais do que já estava. Meu estômago embrulhou de tal maneira, que só deu tempo de eu virar a cabeça para o lado e vomitar o que havia comido de lanche antes da minha luta, o que não agradou nem um pouco o tal do Raditz.
Minha mente então ficou turva, e não consegui mais distinguir o tempo ao meu redor. Deveria ser por causa da altura. Eu desmaiava e acordava de novo a cada dois minutos, ou vinte, não sei dizer, desorientada pela velocidade que nos movimentávamos e com uma vertigem que nenhum golpe que já levei na cabeça em lutas passadas foram capazes de se igualar. Só sei que Raditz não parava de resmungar e conversar consigo mesmo sobre alguém com muita energia estar se movendo rápido demais em alguma direção.
Nunca me senti tão impotente. Mas, o que eu poderia fazer naquela situação? O máximo seria espernear sobre as costas dele, o que daria em dois resultados: ou era nocauteada de novo (conforme a ameaça que recebi), ou cairia para uma morte certa.
A paisagem desértica deu lugar ao mar, cobrindo tudo abaixo de nós. Raditz então diminuiu a velocidade e a altura, o que me fez recuperar a consciência, e pude ver que ele voava em direção a uma única e minúscula ilha plantada no meio de toda aquela imensidão azul, a qual abrigava uma casinha cor-de-rosa, rodeada por três palmeiras. Confesso que, se não fosse pelas circunstâncias, eu teria achado o lugar o mais agradável do mundo e perguntaria o preço do aluguel, só que minha mente estava ocupada demais, imaginando que tipo de terror aquele homem poderia querer fazer comigo ao me levar para uma ilha deserta.
Era difícil enxergar direito da minha posição, mas, conforme nos aproximávamos da ilhota, percebi que ela não estava tão deserta assim. Aos poucos, distingui seis figuras olhando nossa chegada com muita atenção.
Quando Raditz pousou na areia daquela ilhota, ele me tacou no chão aos pés de um daqueles seis indivíduos como se eu fosse um saco de arroz, deixando meu velho kimono branco num aspecto todo sujo e amarelado.
Fechei os olhos ao sentir o solo duro sob o meu corpo, ainda com um grande mal-estar e uma dor de cabeça terrível latejando minhas têmporas.
— M-Mas, o que é isso?! — Ouvi uma nova voz masculina falar acima de mim, seguida por arquejos assustados vindos dos demais. Pelo visto, eu não era a única ali a levar um susto com a presença de Raditz.
Com dificuldades, abri meus olhos, os cobrindo contra o Sol, e olhei para cima, enfim avistando o dono daquela nova voz: um rapaz, próximo à minha idade, com fartos cabelos negros espetados. Sei que não era a hora e nem o momento para tal, mas não pude deixar de reparar que ele usava um belíssimo uniforme de luta laranja e azul-marinho, com pesadas botinas pretas. Era muito robusto e musculoso, porém, em contrapartida, possuía grandes olhos negros que revelavam uma genuína inocência e curiosidade. Só que, tive a estranha sensação de que ele me era familiar…
Logo atrás dele, agarrado à sua perna, uma criança de no máximo uns quatro anos me encarava com assombro; um garotinho muito pequeno, de cabelos longos pretos por baixo de um chapéu vermelho com uma bola laranja no topo, e de cara suspeitei que era o filho do homem que acabei de descrever, pois eram idênticos.
A uma distância, vi outro rapaz, só que era bem baixinho, careca e quase não tinha nariz, usando o mesmo uniforme laranja do primeiro, seguido por uma moça alta de cabelos verdes curtos, um velho barbudo também careca com uma cara de tarado, usando um óculos escuro e segurando um cajado, e… aquilo ali na orla da praia era uma tartaruga-marinha de verdade?!
Não aguentei mais e me virei para o lado, vomitando de novo e sobressaltando os outros mais uma vez.
— Argh! — Ouvi Raditz resmungar com a língua pra fora. — Peço desculpas pelo comportamento dela. É a primeira vez que voou. Seu corpo ainda não está acostumado.
Permaneci caída no chão, massageando a barriga, e não estranhei que ninguém veio me socorrer. Todos estavam evidentemente em choque com nossa repentina chegada. Eu ainda estava em choque com minha chegada.
Vi então que Raditz e o pai do garotinho ficaram se encarando por intermináveis segundos, com o semblante sério e fechado, parecendo inimigos mortais tentando ler o que o outro faria a seguir.
— Enfim te encontrei. — Raditz cruzou os braços na frente da armadura, evidenciando músculos maiores que o do pai do garotinho. — Você cresceu bastante, mas reconheço só de vê-lo, Kakarotto.
Pelo visto, o pai do garotinho conhecia Raditz o tanto quanto eu, pois ele franziu o cenho ao repetir na mais plena confusão:
— Kakarotto?!
— Não estou entendendo nada — disse o rapaz careca. — O que ele está dizendo?
— Hã… Com licença? — Me levantei, apoiada nos joelhos, e ergui as mãos em sinal de rendição enquanto olhava para todos. — Me desculpem, mas… isso por acaso é algum tipo de golpe? Um sequestro relâmpago? Porque, se for, vou logo avisando de que não tenho dinheiro, muito menos alguém que deseje meu resgate. Alguém pode me dizer onde eu esto-
— Silêncio, mulher! — retrucou Raditz, e logo se voltou para o pai do garotinho com uma expressão nada amigável. — Kakarotto! O que está fazendo neste planeta?! Era seu dever acabar com esta raça! Esta era a sua missão! O que esteve fazendo todo este tempo?! — Ele então virou-se para mim e cuspiu: — E quanto a você, Lettie, nem deveria estar aqui, pra começo de conversa!
— Oi??? — repliquei em indignação. — Como eu não deveria estar aqui, se foi você quem me RAPTOU e me trouxe até AQUI?!
— Digo "aqui" em "neste planeta", sua imprestável!
Escancarei a boca, perplexa com tamanha petulância, e percebi como os outros também estavam tão impactados quanto eu.
— Ei, escuta aqui! — O careca tomou a frente e apontou um dedo para Raditz. — Eu não sei quem você é e nem o que está procurando, mas é melhor ir embora! Cai fora! — Ele o espantou com a mão como se fosse uma mera mosquinha irritante.
Na hora percebi a besteira que ele havia feito.
A cauda ao redor da cintura de Raditz emitiu um brilho e, como se tivesse vida própria, esbofeteou o careca com tamanha violência que ele saiu voando em direção à casinha cor-de-rosa, fazendo um rombo nas paredes de madeira, por pouco não acertando o velho barbudo no meio do caminho.
— KURIRIN!!! — exclamou o tal Kakarotto, o qual se voltou para Raditz demonstrando profunda fúria, rangendo os dentes. — Seu… Seu…!!! — Ele então travou, de olhos vidrados ao ver a cauda de Raditz.
Eu ainda estava boquiaberta quando testemunhei os demais também ficarem atônitos ao avistarem a cauda, e estremeci. Por que tive a sensação de que aquilo era um mau sinal?
Raditz ficou balançando sua cauda na frente do corpo, rindo como se exibisse um troféu.
Senti mais uma pontada de dor no final da minha coluna.
— Acho que agora — declarou ele —, você já sabe minha verdadeira identidade.
— Sua identidade? — questionou Kakarotto. — O que quer dizer com isso?
Percebi que o filho dele se mostrava muito preocupado, o puxando pelas calças do uniforme enquanto o pai tentava afastá-lo e, para o meu grande espanto, reparei que o garotinho também tinha uma cauda!
Onde eu estava me metendo?!
Contudo, por alguns segundos, eu e o garotinho trocamos feições aflitas, inseguras e, acima de tudo, assustadas. Não sei se foi a situação que causou isso, mas, algo naquela criança mexeu comigo, fazendo com que seus grandes olhos marejados atingissem diretamente o meu coração.
— Papai, não! — O garotinho choramingou e tentou puxá-lo outra vez, mas a mulher de cabelos verdes curtos logo o pegou no colo, o levando para longe dos adultos.
Pela segunda vez, nossos olhares se encontraram, e senti uma grande compaixão por aquela criança apavorada. Havia algo nele que me causava um intenso sentimento de… proteção. Mas, por quê?
Meus pensamentos foram interrompidos quando ouvi Raditz rosnar:
— Kakarotto! Você é um canalha, como pôde se esquecer de quem você é?!
— Pare de me chamar de Kakarotto! — replicou o próprio, cerrando os punhos. — Meu nome é Goku! Son Goku!
— O quê?! — Raditz ficou indignado. — Como se atreve a dizer isso? — Ele virou-se para mim. — Lettie, diga a eles! Como você descobriu o seu nome?
Todos me encararam, e me senti minúscula.
Por que de repente estávamos falando sobre nomes?!
— E-Eu não sei muito bem… — Me vi obrigada a responder; meus músculos tensionando em ansiedade. — A única coisa que sei é que… fui encontrada num terreno descampado quando bebê, com um papel escrito "Lettie". Só isso. Não sei de mais nada, muito menos quem me deixou lá.
Baixei a cabeça quando uma onda de tristeza me consumiu ao falar em voz alta um evento da minha vida o qual não tenho prazer em remoer. Percebi o olhar de todos sobre mim e, acima de tudo, o conhecido sentimento que invadia as pessoas quando descobriam que eu havia sido abandonada pelos meus genitores: pena (exceto Raditz, é claro).
— Argh! — bufou ele de novo, agora falando mais para si do que para nós. — Então, o que disseram era verdade. Mamãe realmente amoleceu! — Ele olhou para Kakarotto/Goku com visível irritação. — Você por acaso bateu a cabeça quando criança?!
Acredito que foi uma pergunta retórica, só que, para a surpresa de todos, Goku (decidi chamá-lo pelo nome que preferia) respondeu:
— Sim, eu bati a cabeça quando criança. Inclusive, ainda tenho a cicatriz.
O que ouvi a seguir me perturbou bastante. O velho barbudo deu um passo à frente, com uma expressão enigmática, e começou a contar a Goku uma história sobre um outro velho, chamado Son Gohan, o qual, anos atrás, encontrou um objeto estranho no lugar mais profundo do vale. Ao chegar perto, viu uma cápsula em forma de esfera. Dentro dela, encontrou um bebê que tinha uma cauda.
Pelo que entendi, este tal Son Gohan foi o avô adotivo do Goku. Pois bem, este senhor começou a criar Goku, mas percebeu que ele era um serzinho extremamente violento. Um dia, Goku-bebê caiu de um precipício (me pergunto como ele não morreu, é de um precipício que estamos falando!), e bateu feio a cabeça. Mas, ele sobreviveu, e a partir de então, se tornou uma criança amável e gentil, até crescer e se tornar o homem plantado ao meu lado, encarando o velho barbudo em completo estado de estupefação ao aparentemente descobrir seu passado ali, naquele momento.
Agora era eu quem estava com pena dele.
— Que droga, QUE DROGA! — irritou-se Raditz após também ouvir o relato, olhando para mim e Goku. — E pensar que eu achava que encontraria dois grandes guerreiros, mas agora vejo que vocês não passam de uma dupla de inúteis!
Aquilo foi demais pra mim.
— Agora chega! — Meu sangue ferveu ao enunciar as palavras. — Você destrói a minha casa, me sequestra, sai voando comigo pelos ares, me traz para uma ilha no meio do mar e fica aí me xingando sem nem me dar ao menos UMA ÚNICA MÍSERA EXPLICAÇÃO??? Quem você pensa que é?!
— Vou explicar — anunciou Raditz, impassivo e sem sair do lugar. — Kakarotto, Lettie… Vocês não pertencem à raça humana deste planeta. Seu planeta natal é Vegeta. Vocês pertencem aos guerreiros mais fortes do Universo. Vocês são Saiyajins! E eu, Raditz, sou o seu irmão mais velho!
Todos os pelos do meu corpo se arrepiaram quando a afirmação dele adentrou meu subconsciente e atingiu minhas entranhas como o mais violento dos ataques.
Uma sequência de "O quê?!", "Como assim???", "Irmão mais velho?" e "Guerreiros mais fortes do Universo??!" foi ouvida, externalizada pelos demais.
Goku e eu nos entreolhamos; nossos semblantes estampando a mais pura confusão e perplexidade.
Não. Aquilo só poderia ser um golpe, mesmo.
Não era possível…
Eu não tenho irmãos. Não tenho família alguma.
Meu passado só inclui uma única pessoa: eu.
Mas, por que algo em minha alma gritava em alerta? Por que a dor no final da minha coluna estava atingindo o seu ápice?
— Papai!!! — O filho de Goku de repente correu até ele e se agarrou em sua perna, com a mulher de cabelos verdes vindo em seu encalço e o chamando pelo nome de Gohan. Pelo visto, Goku homenageou o avô adotivo ao colocar seu nome no filho.
— I-ISSO É… — Ele tentava falar e afastar Gohan ao mesmo tempo. — ISSO É MENTIRA!
— Você só pode ser um louco maníaco! — acrescentei; meu rosto transfigurado ao fitar Raditz.
— Não pode ser verdade! — alegou Kuririn, o qual havia saído do buraco que fez na casinha cor-de-rosa. — Se Goku e até mesmo essa… essa moça, Lettie, são extraterrestres, porque eles estão aqui na Terra?!
Raditz soltou uma risada apavorante. Ele parecia se divertir com tudo aquilo.
Percebi como Goku transpirava tanto quanto eu.
— A resposta é simples — respondeu Raditz. — Kakarotto, você, exclusivamente, foi mandado a este planeta para acabar com todos os seres humanos que se colocassem em nosso caminho! Já você, Lettie, foi mandada a este planeta por um mero e infeliz acidente.
— Como é?! — retorquiu Goku.
— O-O que está dizendo? — indaguei.
— Nós, os Saiyajins, somos uma família de poderosos guerreiros — repetiu Raditz. — Viajamos pelo Universo para procurarmos planetas com bom meio ambiente, e eliminamos todos os indivíduos que vivem neles, e por último, vendemos o planeta por um preço muito alto para os extraterrestres. Sempre enviamos guerreiros adultos aos planetas em que vivem lutadores muito fortes. Mas, aos planetas fracos como este, mandamos bebês, como foi o seu caso, Kakarotto.
Goku buscou o meu olhar, e eu o dele. O que acabamos de ouvir parecia algo vindo de um filme de ficção científica. Entretanto, ao analisar bem Raditz, não pude negar o que estava diante dos meus olhos. Aquele cara, de fato, não era humano.
— Se o que diz é verdade — começou Kuririn —, vocês são o pior tipo de ser vivo que pode existir, isso é terrível!
— Não posso acreditar que mandem bebês sozinhos viajando pelo Universo! — A mulher de cabelos verdes abraçou o filho de Goku num inconsciente ato materno. No meu íntimo, pensei o mesmo.
— Lettie — Raditz então se dirigiu a mim, ignorando os outros —, com você, foi um pouco diferente e, digamos, nada heroico ou digno de nossa raça Saiyajin.
Me empertiguei, engolindo em seco.
— Você também foi enviada aqui para a Terra por uma cápsula quando bebê — prosseguiu ele. — Cerca de dois anos após o nascimento de Kakarotto. Só que, não foi enviada para destruir este planeta. Não sei explicar assuntos concernentes ao coração, independente da raça que for, mas, o coração de nossa mãe ficou fraco e amoleceu quando deu à luz a você. O planeta em que habitávamos estava para ser destruído por uma raça rival durante um período de guerras e, como um último ato de — ele adquiriu um tom enojado — "amor e compaixão" para com sua prole, nossa mãe te colocou numa cápsula para você se salvar, e deixou que ela tomasse seu rumo. Pelo visto, o rumo da sua cápsula deu no planeta Terra. Que mal gosto.
Não senti mais nada. Meus membros adormeceram e formigaram. Isso queria dizer que, no final das contas, eu não fui… abandonada? Eu tinha uma mãe que me… desejava? Mas que precisou me mandar literalmente Universo afora numa última esperança de salvar a minha vida?
Um nó se formou em minha garganta, mas o engoli. Não. Eu não podia mostrar fraqueza naquele momento.
— Kakarotto, Lettie, olhem só para nós três. — Raditz abriu os braços. — Somos um o focinho do outro. O mesmo formato de rosto, nariz, boca… Até nossos cabelos são parecidos; negros e espetados, apesar de que este seu cabelo curto lhe caiu bem, Lettie. Também vale mencionar que seus olhos azuis são uma herança genética de nossa avó materna que eu e Kakarotto tivemos o infortúnio de não herdar. Não vai se achar por causa disso, hein? Hahaha!
Me senti exposta ao ter meus atributos físicos relatados por um homem que até ali só havia me feito sentir náuseas.
Porém, ao escrutinar Goku e até mesmo Raditz com atenção, algo neles refletiu uma semelhança muito familiar que eu contemplava todos os dias no espelho do meu quarto alugado na arena clandestina.
De relance, olhei de novo para Gohan, encolhido nos braços da mulher, e também vi alguma semelhança em seu rosto; algo que fez meu coração pulsar mais forte ao sentir uma espécie de… conexão.
Contudo, voltei a ficar em alerta ao ver como Raditz também olhava para o filho de Goku com uma feição e sorriso sombrio. Foi só então que percebi que ele estava olhando para a cauda de Gohan.
— Kakarotto! — exclamou Raditz de repente. — Dentro de alguns anos, você sozinho pode acabar com todos os terrestres, isso se você se lembrar da ordem que lhe foi dada. E isso te inclui também, Lettie. Não pense que irá se safar disso só por causa da fraqueza ridícula de nossa mãe.
É o quê?!
Raditz então cruzou os braços e olhou para os céus.
— Por sorte pode-se ver a Lua aqui deste planeta.
Goku ficou tão desconcertado quanto eu.
— Por que você disse isso? — questionei.
— Desde quando corpos celestes se tornaram o tema central desta conversa??? — acrescentou ele.
— NÃO SEJAM IDIOTAS! — retrucou Raditz. — Nós, os Saiyajins, podemos lutar com toda a nossa força quando vemos a Lua Cheia! Nos transformamos em macacos gigantes e adquirimos um poder de destruição imbatível!
Oi? Macacos gigantes?
Um balde d'água congelante não teria causado um efeito maior do que aquela afirmação me causou, e piorou quando ouvi Kuririn, a mulher de cabelos verdes e o velho arquejarem com genuíno pavor, ficando até pálidos.
Tive a incômoda sensação de que eles sabiam de alguma coisa sobre aquilo.
Ainda bem que Goku externalizou minha pergunta:
— Que história é essa? Não estou entendendo nada do que você está falando!
Raditz ficou embasbacado.
— O quê?! Impossível! — Ele se aproximou e espiou por trás de nós. — Agora que estou vendo! C-Cadê… Cadê a cauda de vocês dois?!
Não acredito que eu de fato me virei para procurar alguma cauda presa em minhas costas, mas, paciência. Eu não estava tendo um bom dia. No fim, não me senti tão mal, pois Goku havia feito o mesmo.
— O QUE ACONTECEU COM A CAUDA DE VOCÊS?!?! — exigiu Raditz.
— A minha cauda foi arrancada há muito tempo de mim — alegou Goku, convicto.
— E VOCÊ, LETTIE?
Eu? O que aconteceu com a minha cauda? Ora essa, mas que cauda??? Do que esse maluco estava falando? E por que raios Goku tinha uma resposta pronta para esta pergunta? Desde quando humanos têm caudas?!?!?!
Mas aí, me dei conta de que, ao invés de corpos celestes, o tema central daquela conversa era a revelação de que eu e, aparentemente, meus irmãos mais velhos, Goku e Raditz, pertencíamos a uma raça ALIENÍGENA, o que, no fundo, explicaria o motivo da existência de uma… cauda.
Senti mais uma pontada de dor no final da minha coluna, e de repente, foi como se eu tivesse sido esbofeteada na cara.
Será que essa… dor na minha coluna… poderia estar relacionada a uma… cauda?
Não senti mais o solo arenoso sob os meus pés.
— RESPONDA, LETTIE! ONDE. ESTÁ. SUA. CAUDA?!
— E-E-Eu não sei! Confesso que… tenho, sim, uma dor crônica no final da minha coluna desde que me conheço por gente… Mas, nunca soube o porquê disso.
— Ah, droga! — Raditz cerrou os punhos. — No seu caso, devem ter arrancado quando te encontraram ainda bebê. Devem ter te achado uma aberração. É o único motivo plausível!
Uau. Isso explicava muita coisa em relação ao comportamento de algumas pessoas de minha infância para comigo.
— VOCÊS DOIS SÃO UNS IMBECIS!!! — esbravejou Raditz. — Agora está explicado o porquê vocês vivem de maneira tão pacífica neste planeta! Não têm cauda!!!
Sério isso? Ou seria porque eu e Goku não sofremos uma lavagem cerebral que nos levariam a exterminar seres de outros planetas por um benefício monetário? Pelo pouco que observei do pequeno Gohan ali, ele não me parecia nutrir nenhum sentimento de ódio pelos humanos só porque tinha uma cauda.
— Basta! — exclamei, também aliviada ao ver que os demais ao meu redor se mostravam fartos de toda aquela conversa.
— Sim! — concordou Goku, já assumindo uma posição de combate. — Eu não estou nem aí se venho de outro planeta, se sou uma saia jeans ou sabe-se–lá-quem ou se tenho irmãos. — Ele virou-se para mim. — Exceto você, Lettie. Você parece ser gente boa e é bem-vinda na família.
— O-Obrigada…?
— Kuririn tem razão! Raditz, vocês são o que há de pior! — Ele apontou para si. — Eu sou Goku e fui criado AQUI, na Terra! Agora, vá embora e nos deixem em paz!
— Isso mesmo! — exclamou a mulher! — Vá embora!
— Sim! — O velho barbudo foi ao lado de Goku. — O passado não importa mais. Ele e esta moça têm o direito de serem terrestres!
— Foi Goku quem salvou este planeta da destruição! — declarou Kuririn, o que me fez perguntar quanta coisa sobre o meu irmão eu não sabia. Porém, fiquei tão tocada em como esse grupo peculiar se mostrava tão resoluto, convicto e, principalmente, unidos, que também me pus a falar:
— Escute, Raditz. Você já viu que não queremos problemas, mas, se insistir, terá de arcar com as consequências dos seus próprios atos.
— Muito bem dito, irmãzinha. — Goku piscou para mim com um sorriso, e pela primeira vez desde que pisei naquela ilhota, senti uma pontada de alegria.
Raditz, no entanto, não ficou nem um pouco intimidado.
— Não posso fazer isso. — Ele se pôs a caminhar ao redor, rindo com desdém. — Além do mais, a família dos Saiyajins era muito reduzida. O planeta Vegeta foi dizimado, e a maior parte de nossa raça desapareceu do Universo, assim como nosso pai e nossa mãe. Sobraram vivos somente cinco Saiyajins, incluindo vocês dois. O outro sou eu, o quarto foi mandado para lutar em outro planeta, e o último foi mandado a um planeta desconhecido. — Ele pausou por um instante. — Em certa ocasião, pudemos encontrar um bom planeta e queríamos atacá-lo, porém, éramos apenas três contra um planeta inteiro. — Ele virou-se para Goku e eu. — Foi naquele momento que pensei em vocês. — Ele então caminhou até nós. — Mas, você, Kakarotto, não possui seu poder de luta completo. É forte, mas não o bastante. Já você, Lettie, ainda falta muito para alcançar o próprio Goku. Eu te vi na arena. Você tem potencial e sabe lutar, isso é fato, mas lhe falta treinamento.
Suas palavras só confirmaram o que pensei durante minha vida toda. Troquei olhares com Goku, e me senti envergonhada. Pelas coisas absurdas que ouvi até então, era capaz até daquela tartaruga-marinha escondida num canto da casinha cor-de-rosa ser mais forte do que eu.
— Contudo — prosseguiu Raditz, nos encarando face a face —, se vocês se unirem a nós três, poderemos conseguir.
— Nem pensar! Afaste-se! — Goku se colocou na frente de todos. Aquele não era a hora ou o momento, mas, depois de passar uma vida inteira tentando sobreviver sozinha num mundo tão hostil, a sensação de ter alguém querendo te proteger foi muito, muito boa.
— Vamos! Abram os olhos! — Raditz se inclinou e todos demos um passo para trás. — Será divertido! Não sentem como correm em vocês o sangue dos Saiyajins?!
— Papai, estou com medo… — choramingou Gohan, abraçado à mulher.
— Ei… — Virei-me para ele com a melhor tentativa de um sorriso reconfortante. — Não se preocupe, vai ficar tudo bem.
Meu olhar se encontrou com o da mulher, e nós duas pudemos ver uma na outra que existia uma grande chance de eu estar errada, e foi a vez dela de tentar esboçar um sorriso reconfortante para mim.
— Pare de falar besteiras, Raditz! — alertou Goku. — Nem morto irei te ajudar a destruir este planeta! Se tem uma coisa boa que tirei de descobrir que tenho irmãos, foi de saber que pelo menos uma é decente!
Ao ouvir as palavras de Goku, toquei em seu braço e me coloquei ao seu lado.
— Não há nada para você aqui neste planeta, Raditz. Este é o nosso último aviso. Vá embora e esqueça da nossa existência. Considere-se órfão e sem irmãos, pois o único que tenho, se chama Son Goku.
— Aww, que lindo, meloso e chato. — Raditz revirou os olhos. — Não importa o que vocês digam, irão ajudar a destruir o planeta Terra. — Seu olhar então se dirigiu a Gohan, agora com a cara enfiada no pescoço da mulher, tremendo por inteiro.
Eu e Goku trocamos olhares perturbados, pois percebemos o que se passava na mente de Raditz, o qual apontou para Gohan e perguntou:
— Por acaso este garoto é o seu filho?
Goku pôs-se a negar veementemente, como se pudesse apagar as diversas exclamações de "Papai!" vindas de Gohan nos últimos minutos. Meu coração afundou ao ouvir o desespero em sua voz, sobretudo quando também ouvi Gohan chorar enquanto as vozes dos adultos se elevavam.
— NÃO MINTA PARA MIM! — retrucou Raditz. — O que me diz dessa cauda? Não é uma prova de que ele tem sangue dos Saiyajins?!
A mulher tentou esconder a cauda de Gohan por debaixo das pernas, mas seu esforço era inútil. Meu coração latejava em meus ouvidos ao ver que a tensão naquela ilhota só aumentava. Todos ali estavam no mais alto estado de alerta.
— E daí?! — Goku contorceu o rosto em ferocidade. — O que é que tem?!
— Parece que vocês não querem entender o que estou dizendo. — Raditz abriu um sorriso sinistro. — Acho que tomarei o seu filho emprestado! — E caminhou em nossa direção.
Acredito que Goku ficou tão embasbacado com as palavras de Raditz, que, por um instante, baixou a guarda. Ao vê-lo naquele estado e, acima disso, ver aquele garotinho tão pequeno (que só então me dei conta de que era meu sobrinho), exibindo olhos inchados e vermelhos repletos de terror, virei-me para a mulher e sussurrei:
— Psiu! Qual é o seu nome?
— O-O quê…?
— Como você se chama?
— B-Bulma… Bulma Brief.
— Bulma, leve Gohan para longe. Tentaremos detê-lo!
Ela não pensou duas vezes e correu com ele até tomarem uma boa distância, mas não tinha tantas opções para onde ir considerando o tamanho minúsculo da ilha. Dito isso, dei um passo à frente e elevei a voz:
— Raditz, se quiser o garoto, terá de passar por nós, primeiro!
O encarei sentindo uma inesperada fúria correr pelas minhas veias. Eu não compreendia o porquê eu estava demonstrando tal comportamento. Eu nem ao menos conhecia Goku, Gohan, ou os outros ali. Mas, algo dentro de mim me dizia que lutar ao lado deles era a coisa certa a fazer. Além do mais, qual outra escolha eu tinha?
— Raditz, não se aproxime! — Goku pareceu voltar ao normal ao ver minha atitude, e juntos, assumimos posição de combate, com Kuririn e o velho barbudo também se posicionando ao nosso lado.
— Mestre Kame, ao seu dispor, senhorita — apresentou-se o velho, soturno por trás dos óculos escuros. — Sou o treinador de Goku. Lamento que o conheceu nessas condições.
— Muito prazer, Mestre — respondi no mesmo tom, grata por conhecer de tão perto um Mestre de Artes Marciais, mas sem tirar os olhos de Raditz. — De fato, é uma pena. Preferia que fosse numa luta amistosa num torneio da cidade.
Nosso inimigo se aproximava rápido.
— Se der mais um passo, acabo com voc- Goku mal terminou a frase e foi esmurrado na boca do estômago por Raditz, e saiu voando até cair num baque na orla da praia, gemendo em profunda dor e agonia.
Fiquei ali, com olhos vidrados encarando meu irmão caído na areia. Como aquilo foi acontecer? Raditz não havia dito que Goku era forte? Como pôde ter sido derrotado com apenas um único golpe?
— Papai!!! — Gohan disparou até ele, escapando das mãos de Bulma.
Quando me dei conta, eu também já havia corrido na frente de Raditz:
— PARE! NÃO OUSE ENCOSTAR UM DEDO NEL- Uma dor dilacerante emergiu das minhas entranhas quando ele me chutou bem no meio do peito, me fazendo voar para longe assim como Goku e cair na água do mar gelado com o corpo meio submerso na parte rasa.
Eu não conseguia respirar. O ar simplesmente não entrava, como se meus pulmões tivessem parado de funcionar pelo susto que levamos. Tinha certeza de que minha caixa torácica fora quebrada, tamanha dor me consumia, queimando de dentro pra fora.
Cada centímetro do meu corpo clamava por socorro. Eu nunca havia sido golpeada daquela forma. Nunca. Nem em meus piores adversários nos inúmeros torneios clandestinos que já participei. Quanta força Raditz tinha, quanto… poder!!!
Ouvi o burburinho alarmante vindo dos outros, ora chamando por Goku, ora chamando por Gohan, ora chamando por mim. Tentei me levantar, mas foi só para cair de novo, engolindo água salgada no meio do caminho.
Quis vomitar pela terceira vez. No entanto, caída de costas naquela água, tentando recuperar meu fôlego em desespero, agarrando meu kimono na região do peito, sem querer, avistei algo bem distante nos céus, ou melhor, alguém.
Um tremor, que não veio da água gelada, me acometeu.
Lá do alto, uma figura nos observava, flutuando no ar. Não consegui distinguir quem era, apenas que possuía uma capa branca esvoaçando ao vento. Esfreguei os olhos e os fechei. Quando os abri de novo, a figura não estava mais lá.
O golpe de Raditz deve ter me causado alucinações.
Me sentindo mais inútil que uma pedra, tentei me levantar outra vez, tirando forças de onde não tinha, mas logo caí de novo, enquanto, ao longe na beira da praia, testemunhei Raditz erguer Gohan no ar pela roupa e declarar:
— Kakarotto, ficarei com seu filho. Se quiser ele de volta com vida, obedecerá às ordens do seu irmão. — Ele me fitou e elevou a voz: — Isso vale para você, também, Lettie!
Gohan chorava sem parar. Eu e Goku estávamos imobilizados pela dor; já Bulma, Kuririn e Mestre Kame, imobilizados pelo medo.
— Kakarotto, Lettie, darei a vocês apenas um dia para que pensem — continuou Raditz. — Creio que não terão outra escolha, a não ser se juntar a nós. Porém — sua voz se agravou — terão que me dar uma prova, e será uma coisa bem fácil. Vocês precisam eliminar cem seres humanos deste planeta. E nada de ser cinquenta cada um. Eu quero duzentos no total. Vocês têm até esta mesma hora de amanhã, e deverão trazer seus corpos neste lugar!
Tenho certeza de que eu e os outros perdemos toda a cor de nossos rostos. Assim como também percebi como Goku de repente parou de se mexer, em choque ao ouvir tais condições para ter seu filho de volta. Até o pequeno Gohan pareceu entender a gravidade da situação em que se encontrava.
— Espero que eu tenha sido claro — finalizou Raditz. — Amanhã será muito divertido. Não se preocupe, farei todo o possível para não acabar com o filho do meu irmãozinho. Quero ele junto quando todos nós, os Saiyajins, nos unirmos para destruir a Terra! HAHAHAHAHA!!!
Ao ver Goku erguendo a mão, ainda caído na areia, numa tentativa inútil de alcançar seu filho, senti uma lágrima descer pelo meu olho e escorrer até minha boca.
Nunca, em todos as lutas, momentos, dificuldades ou pesadelos que já tive na vida, achei que presenciaria tamanha barbaridade. Duas horas atrás, minha única preocupação era se eu conseguiria vencer uma luta numa arena clandestina e organizar minhas finanças para sobreviver naquele mês.
Mas, ali, meu coração gritava em fúria e em indignação ao me ver prostrada e derrotada no chão com um de meus irmãos mais velhos, enquanto o outro levava o meu sobrinho para um destino inimaginável.
CURIOSIDADE BÔNUS:
Sabemos que os nomes dos Saiyajins são baseados em alguns alimentos.
Goku, por exemplo, é Kakarotto (carrot/cenoura), Raditz (radish/rabanete), Vegeta (vegetable/vegetal), e por aí vai...
O nome de Lettie também foi criado para se adaptar a esta brincadeira, usando a palavra Lettuce (Alface) como base hihihi.