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Um jovem homem franzino com pele pálida e olheiras estava sentado em um banco enferrujado em frente à delegacia. Ele estava segurando com cuidado uma xícara de café em suas mãos — não do tipo sintético barato que os moradores da favela como ele tinham acesso, mas o verdadeiro. Essa xícara de café à base de planta, geralmente disponível apenas para cidadãos de classe alta, custou quase todas as suas economias. Mas, naquele dia específico, Sunny decidiu que queria se dar um mimo.
Afinal, sua vida estava chegando ao fim.
Desfrutando do calor da bebida luxuosa, ele ergueu a xícara e saboreou o aroma. Então, hesitante, ele deu um pequeno gole... e imediatamente fez uma careta.
"Ah! Que amargo!"
Dando um olhar intenso para a xícara de café, Sunny suspirou e se obrigou a beber um pouco mais. Amargo ou não, ele estava determinado a aproveitar até o último centavo do seu dinheiro — que se danassem as papilas gustativas.
"Eu deveria ter comprado um pedaço de carne de verdade. Quem diria que café de verdade é tão nojento? Bem. Pelo menos vai me manter acordado."
Ele olhou para a distância, cochilando, e então se deu um tapa no rosto para acordar.
"Tsk. Que enganação."
Balançando a cabeça e resmungando, Sunny terminou o café e se levantou. Pessoas ricas que moravam nesta parte da cidade passavam correndo pelo pequeno parque a caminho do trabalho, olhando para ele com expressões estranhas. Com suas roupas baratas e a aparência de quem não dorme há dias, magro e pálido de forma nada saudável, Sunny realmente não parecia pertencer àquele lugar. Além disso, todos pareciam tão altos. Observando-os com um pouco de inveja, ele jogou a xícara em uma lixeira.
"Acho que é isso que três refeições por dia fazem com você."
A xícara errou a lixeira por um grande espaço e caiu no chão. Sunny revirou os olhos irritado, caminhou até ela, pegou e colocou cuidadosamente no lixo. Então, com um pequeno sorriso, atravessou a rua e entrou na delegacia.
Lá dentro, um oficial de aparência cansada deu-lhe um rápido olhar e franziu o cenho com óbvio desgosto.
"Você está perdido, garoto?"
Sunny olhou ao redor com curiosidade, notando placas de armaduras reforçadas nas paredes e ninhos de metralhadoras mal escondidos no teto. O oficial também parecia desleixado e mau. Pelo menos as delegacias continuavam iguais, não importava onde você fosse.
"Ei! Estou falando com você!"
Sunny limpou a garganta.
"Uh, não."
Então ele coçou a nuca e acrescentou:
"Conforme exigido pela Terceira Diretriz Especial, estou aqui para me entregar como portador da Magia do Pesadelo."
A expressão do oficial mudou instantaneamente de irritada para cautelosa. Ele examinou o jovem homem mais uma vez, desta vez com intensidade penetrante.
"Você tem certeza de que está infectado? Quando começou a apresentar sintomas?"
Sunny deu de ombros.
"Uma semana atrás?"
O oficial ficou visivelmente mais pálido.
"Merda."
Então, com um movimento apressado, ele apertou um botão no terminal e berrava:
"Atenção! Código Preto no saguão! Repito! CÓDIGO PRETO!"
***
A Magia do Pesadelo apareceu no mundo algumas décadas atrás. Naquela época, o planeta estava apenas começando a se recuperar de uma série de desastres naturais devastadores e subsequentes guerras por recursos.
De início, o surgimento de uma nova doença que levou milhões de pessoas a reclamar de fadiga e sonolência constante não atraiu muita atenção. Mas quando eles começaram a cair em um sono antinatural, sem sinais de acordar mesmo depois de dias, os governos finalmente entraram em pânico. Claro, até então já era tarde demais — não que uma resposta precoce pudesse ter feito alguma diferença.
Quando os infectados começaram a morrer em seu sono, seus corpos mortos se transformando em monstros, ninguém estava preparado. As Criaturas do Pesadelo rapidamente dominaram militares nacionais, mergulhando o mundo em completo caos.
Ninguém sabia o que era o Feitiço, quais poderes ele possuía e como combatê-lo.
No final, foram os Despertos — aqueles que sobreviveram aos primeiros julgamentos do Feitiço e voltaram vivos — que puseram fim sua devastação. Armados com habilidades milagrosas adquiridas em seus Pesadelos, eles restauraram a paz e criaram uma semelhança de uma nova ordem.
Claro, foi apenas o primeiro dos desastres causados pelo Feitiço. Mas, na opinião de Sunny, nada disso tinha a ver com ele — pelo menos não até alguns dias atrás, quando ele começou a ter problemas para ficar acordado.
Para uma pessoa comum, ser escolhido pelo feitiço era tanto um risco quanto uma oportunidade. As crianças aprendiam habilidades de sobrevivência e técnicas de luta na escola, caso fossem infectadas. Famílias abastadas contratavam tutores particulares para treinar seus filhos em todos os tipos de artes marciais. Aqueles dos clãs Despertos tinham até acesso a poderosos legados, empunhando Memórias e Ecos herdados em sua primeira visita ao Reino dos Sonhos.
Quanto mais rica sua família era, maiores eram suas chances de sobreviver e se tornar um Desperto.
Mas para Sunny, que não tinha família e passava a maior parte do tempo vasculhando os lixos atrás de comida em vez de ir à escola, ser escolhido pelo feitiço não apresentava oportunidade alguma. Para ele, era basicamente uma sentença de morte.
***
Alguns minutos depois, Sunny bocejou enquanto vários policiais estavam ocupados colocando-o em restrições. Logo ele estava preso em uma cadeira grande e volumosa que parecia uma mistura estranha entre uma cama de hospital e um dispositivo de tortura. A sala em que estavam estava no porão da delegacia, com paredes blindadas espessas e uma porta de cofre com aspecto formidável. Outros oficiais estavam perto das paredes, com fuzis automáticos nas mãos e expressões severas nos rostos.
Sunny não se importava muito com eles. A única coisa em que ele conseguia pensar era o quanto ele queria dormir.
Finalmente, a porta do cofre se abriu e um policial grisalho entrou. Ele tinha um rosto experiente e olhos severos, parecendo alguém que tinha visto muitas coisas terríveis em sua vida. Depois de verificar as restrições, o policial lançou um olhar rápido no relógio de pulso e depois se virou para Sunny:
"Qual é o seu nome, garoto?"
Sunny piscou algumas vezes, tentando se concentrar e, então, se mexeu desconfortavelmente.
"Sem Sol."
O policial idoso ergueu uma sobrancelha.
"Sem Sol? Esse é um nome estranho."
Sunny tentou dar de ombros, mas percebeu que não conseguia se mover.
"O que tem de estranho nisso? Pelo menos eu tenho um nome. Lá na periferia, nem todo mundo tem um."
Depois de outro bocejo, ele acrescentou:
"É porque eu nasci durante um eclipse solar. Minha mãe tinha uma alma poética, entende?"
Foi por isso que ele ganhou esse nome estranho e sua irmãzinha foi chamada de Chuva... quando ela ainda morava com eles, pelo menos. Ele não sabia se era resultado da imaginação poética ou simples preguiça.
O policial velho grunhiu.
"Você quer que eu entre em contato com sua família?"
Sunny simplesmente balançou a cabeça.
"Não tem ninguém. Não se incomode."
Por um segundo, havia um olhar sombrio no rosto do policial. Então, sua expressão ficou séria.
"Tudo bem, Sem Sol. Quanto tempo você consegue ficar acordado?"
"Uh... não muito."
O policial suspirou.
"Então não temos tempo para o procedimento completo. Tente resistir o máximo que puder e ouça-me com muita atenção. Certo?"
Não esperando uma resposta, ele acrescentou:
"O quanto você sabe sobre a Magia do Pesadelo?"
Sunny deu-lhe um olhar interrogativo.
"Tanto quanto qualquer um, eu acho? Quem não sabe sobre o feitiço?"
"Não estou falando das coisas fantasiosas que você vê em dramas e escuta nas transmissões de propaganda. Quero dizer, o quanto você realmente sabe?"
Essa era uma pergunta difícil de responder.
"Não é só eu entrar no Reino dos Sonhos, matar alguns monstros para completar o Primeiro Pesadelo, receber poderes mágicos e me tornar um Desperto?"
O policial idoso balançou a cabeça.
"Escute com atenção. Assim que você adormecer, será levado para dentro do seu Primeiro Pesadelo. Os Pesadelos são provações criadas pelo Feitiço. Uma vez lá dentro, você encontrará monstros, claro, mas também encontrará pessoas. Lembre-se: eles não são reais. São apenas ilusões criadas para testar você."
"Como você sabe?"
O policial apenas olhou para ele.
"Quero dizer, ninguém entende o que é o Feitiço e como ele funciona, certo? Então, como você sabe que eles não são reais?"
"Você talvez tenha que matá-los, garoto. Então faça um favor a si mesmo e pense neles apenas como ilusões."
"Ah."
O policial velho esperou um segundo e depois acenou com a cabeça e continuou.
"Muitas coisas sobre o Primeiro Pesadelo dependem da sorte. Geralmente, não deve ser algo extremamente difícil. A situação em que você se encontra, as ferramentas à sua disposição e as criaturas que precisa derrotar devem estar dentro do alcance de suas capacidades, pelo menos. Afinal, o Feitiço estabelece provações, não execuções. Você está um pouco desfavorecido devido a... bem... suas circunstâncias. Mas os garotos da periferia são resistentes. Não desista de si mesmo ainda."
"Uh-huh."
Sunny estava ficando cada vez mais sonolento. Estava se tornando difícil acompanhar a conversa.
"Sobre esses "poderes mágicos" que você mencionou... você receberá mesmo se sobreviver até o fim do Pesadelo. O que exatamente esses poderes serão depende da sua afinidade natural e do que fizer durante a provação. Mas algumas coisas estarão disponíveis desde o início..."
A voz do policial idoso soava cada vez mais distante. As pálpebras de Sunny estavam tão pesadas que ele lutava para manter os olhos abertos.
"Lembre-se: a primeira coisa que você deve fazer assim que entrar no Pesadelo é verificar seus Atributos e seu Aspecto. Se conseguir um Aspecto voltado para o combate, como um Espadachim ou um Arqueiro, as coisas serão mais fáceis. Se for reforçado por um Atributo físico, então é ainda melhor. Aspectos de Combate são os mais comuns, então a probabilidade de recebê-los é alta."
A sala blindada estava ficando cada vez mais escura.
"Se você não tiver sorte e seu Aspecto não tiver nada a ver com o combate, não se desespere. Feitiços e Aspectos úteis são úteis à sua maneira, você só tem que ser inteligente a respeito. Não há Aspectos inúteis. Bem, quase. Então faça tudo o que puder para sobreviver."
"Se você sobreviver, estará a meio caminho de se tornar um Desperto. Mas se morrer, abrirá um portal para que uma Criatura do Pesadelo apareça no mundo real. O que significa que meus colegas e eu teremos que lidar com ela. Então... por favor, não morra, Sem Sol."
Já quase adormecido, Sunny se sentiu um pouco emocionado com as palavras do policial.
"Ou, pelo menos, tente não morrer logo de cara. O Desperto mais próximo não conseguirá chegar aqui por algumas horas, então realmente apreciaríamos se você não nos fizesse lutar contra aquilo sozinhos..."
'O quê?'
Com esse último pensamento, Sunny finalmente mergulhou em um sono profundo.
Tudo ficou escuro.
E então, na escuridão, uma voz vagamente familiar soou:
[Aspirante! Bem-vindo à Magia do Pesadelo. Prepare-se para o seu Primeiro Julgamento...]